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Na Bahia, meta de ONGs é proibir PM de usar cavalos

3 de julho de 2011
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A expressão “mais enfeitado do que jegue da Lavagem do Bonfim”, corrente nas ruas baianas, pode ter seu significado esvaziado na linguagem popular. As ONGs (Organizações Não-Governamentais) protetoras de animais vêm recorrendo à Justiça para acabar com o uso de animais em desfiles cívicos, em festas de rua e, em breve, nas patrulhas da Polícia Militar.

Em Salvador, após um encontro entre a Fundação Gregório de Mattos (FGM) – equivalente a uma secretaria da Cultura – e os militantes da ONG Terra Verde Viva, no Ministério Público estadual, definiu-se que não haverá o concurso de carroça mais enfeitada no desfile cívico de Dois de Julho, que comemora a Independência do Brasil na Bahia.

"Encourados de Pedrão", o pelotão de vaqueiros da Independência na Bahia, desfila no dia Dois de Julho pelas ruas do Centro de Salvador. Foto: Alberto Coutinho/ Agecom-BA/Divulgação

As ameaças judiciais respingaram sobre um pelotão histórico, o Encourados de Pedrão, que celebra os vaqueiros baianos envolvidos nas batalhas contra os colonizadores portugueses, em 1823. Se depender dos ambientalistas, não haverá galopada.

“Infelizmente, as pessoas pensam que animal não tem sentimentos, não sente mal-estar”, explica a advogada Ana Rita Tavares, membro da Terra Verde Vida. Ela relembra a trajetória da ação: o cerco aos Encourados nasce de um processo criminal contra a FGM, movido em 2008 pela ONG Bicho Feliz, a qual se irritou com o concurso de penduricalhos nas carroças.

Nos últimos anos, os ambientalistas conquistaram a expulsão de cavalos, jegues e burros – além de outros animais da Arca – das festas tradicionais de Salvador, a exemplo da Lavagem do Bonfim e do bloco carnavalesco e popular Mudança do Garcia. E, as cavalarias da Polícia Militar e dos Dragões da Independência podem cair nos arquivos implacáveis dos ativistas, como revela a articuladora jurídica das ONGs.

“Isso é uma coisa que a gente está fazendo paulatinamente. Primeiro, Lavagem do Bonfim. Depois, Mudança do Garcia. Agora, o Dois de Julho. Para enfrentar essa questão da Polícia Militar, depende de alterar a legislação, depende de ser apresentado um projeto de lei. É mais complicado. Mas que a gente vai nesse caminho, vai”, anuncia Ana Rita.

Prefeito critica “medo”

Apesar das ameaças de medidas criminais e da ausência do tradicional convite da Fundação Gregório de Mattos, o prefeito de Pedrão (BA), Alceu Barros, decidiu preservar o desfile histórico e entrar com os vaqueiros na Estrada da Liberdade.

“Nós vamos fazer. Não existe nada proibindo. É a representação de um fato histórico. O Encourados participou da Guerra da Independência, com 41 vaqueiros. Eles se apresentaram ao general Labatut, em Cachoeira, e realizaram a patrulha de Salvador na trégua com os portugueses”, descreve Barros. O prefeito lamenta o “medo” dos administradores públicos de Salvador, nos confrontos com as ONGs.

Pesquisador da história do pelotão de vaqueiros, o jornalista Fernando Rocha ataca a infantaria dos ambientalistas: “É completamente absurdo. Nunca teve problema nenhum. Como é que fazem isso? Para perceber a importância do Encourados, não precisa nem ter leitura, basta ter conhecimento do que foi a guerra da Independência”, afirma Rocha.

Ana Rita Tavares garante que as ONGs não são oportunistas. “Nosso objetivo, antes de ser uma postura de brigar, é de educar”, conta. “A criança e o adolescente que presenciam esse ato de humilhação, de submissão, de manipulação do animal, recebem uma mensagem subliminar para fazer isso com um próximo dela. Existe um estudo de que toda criança que maltratou um animal vai, no futuro, delinquir de alguma forma”, esclarece.

“Libertação de escravos”

O promotor de justiça da 2ª Vara do Meio Ambiente, Heron Santana, relata que houve uma consulta da Fundação sobre a presença de cavalos no desfile, mas que terminou arquivada. “O Ministério Público não é um órgão de consulta. E não tinha nenhuma denúncia”, diz. Santana acrescenta: “Eu sou tido como o promotor mais duro em relação aos animais”. Portanto, “se as ONGs forem lá e provarem que houve maus-tratos, podem representar perante o MP”.

A princípio, o promotor fica reticente quanto à proibição do uso de cavalos pelas tropas da PM. “A cavalaria da PM, eu já acho um pouco mais difícil… Mas, você pensando a grosso modo, ela (Ana Rita) não deixa de ter de razão. Um dos ideais da Independência era a libertação dos escravos, e os animais ocuparam esse lugar dos escravos”, compara. “As tradições mudam no decorrer do tempo”.

Fonte: Terra Magazine

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