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EXTINÇÃO

Crise climática é responsável pela queda drástica das populações de animais do Ártico

Aves costeiras nativas e renas estão entre espécies em risco à medida que as estratégias de sobrevivência desenvolvidas pelas espécies são prejudicadas pela nova realidade.

25 de maio de 2021
Luna Mayra Fraga Cury Freitas | Redação ANDA
5 min. de leitura
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Foto: Pixabay

O Ártico terrestre abrange aproximadamente 7 milhões de quilômetros quadrados marcados por frio extremo, seca, ventos fortes e escuridão sazonal. As espécies que vivem neste ambiente adaptaram-se para sobreviver nas condições adversas. Mas a crise climática tem prejudicado tais estratégias de sobrevivência, de acordo com o relatório do Conselho de Estado da Biodiversidade Terrestre do Ártico, publicado pelo grupo de trabalho Conservation of Arctic Flora and Fauna (CAFF – Conservação da Flora e Fauna do Ártico).

“A mudança climática é o gigantesco motor da mudança nos ecossistemas terrestres do Ártico, causando impactos diversos, imprevisíveis e significativos que devem se intensificar”, diz o relatório.

A média de aquecimento no Ártico é o dobro do resto do mundo, levando a eventos climáticos extremos, espécies ao sul movendo-se para o norte, e o surgimento e propagação de patógenos entre espécies nativas.

O relatório, divulgado na quinta-feira na reunião ministerial do conselho em Reykjavik, é o primeiro a avaliar o status e as tendências das espécies do Ártico que vivem em áreas terrestres, seguindo o exemplo da avaliação realizada pelo CAFF em 2017 sobre a biodiversidade marinha.

O relatório baseou-se em décadas de monitoramento da biodiversidade circunpolar para dar uma visão geral das mudanças que ocorrem na região. Parece que o Ártico está se tornando mais verde e arbustos estão se alastrando, substituindo lentamente musgos e líquens na tundra.

Na estação de pesquisa de Zackenberg, no nordeste da Groenlândia, os cientistas descobriram que as importantes moscas polinizadoras diminuíram 80% entre 1996 e 2014, sugerindo uma incompatibilidade, entre o tempo de floração de plantas e atividade de voo polinizador, induzida pelo clima.

Das 88 espécies de aves costeiras, ou limícolas, examinadas, 20% passaram por declínios no número de indivíduos em todas as suas populações, enquanto bem mais da metade tinha pelo menos uma de suas populações em declínio. “Na tundra ártica, as aves costeiras são o grupo mais diversificado de aves; se você é do povo Inuíte, esses seriam os pássaros do seu ambiente”, disse no relatório Paul Allen Smith, biólogo do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas do Canadá e especialista em aves.

Foto: Pixabay

Na rota do leste asiático-australiano, uma via migratória que liga as altas latitudes com o Oceano Pacífico, 88% das aves costeiras estão em declínio. Isso, disse Smith, provavelmente é devido à perda de habitat na região do Mar Amarelo da Ásia, onde os pássaros passam seus invernos.

Estima-se que, em diferentes cenários climáticos, 80% das aves costeiras do Ártico também possam perder grande parte das suas áreas de construção de ninhos e de acasalamento ao norte nos próximos 50 anos.

Tratando-se de renas, cujos rebanhos viajam da Rússia para o Alasca, o rastro climático tem sido mais difícil de se definir, dadas as características populacionais da espécie. “Os números das populações de renas naturalmente flutuam e têm ciclos de abundância”, explicou no relatório Christine Cuyler, consultora do Instituto de Recursos Naturais da Groenlândia e especialista em renas e em bois almiscarados. “Mas para alguns a amplitude da flutuação cresceu. Hoje, estamos vendo flutuações nas quantidades de indivíduos da espécie além dos níveis históricos conhecidos.”

A maioria das populações de espécies migratórias da tundra e de renas da floresta diminuiu nos últimos anos, com poucas exceções. O rebanho da região de Bathurst, que vai dos Territórios do Noroeste do Canadá até Nunavut, caiu 98% entre 1986 e 2018. Cuyler disse que vários fatores provavelmente estão impulsionando esses declínios, incluindo diminuição da disponibilidade de alimentos, eventos de chuva na neve e insetos importunadores, que impedem os ungulados de pastar e ganhar peso suficiente para sobreviver ao inverno.

Temperaturas mais quentes também levaram ao surgimento de patógenos que tiveram um efeito negativo na saúde de alguns animais. Em 2012, um surto de erisipela, uma infecção bacteriana que afeta a pele, matou cerca de 150 bois almiscarados na Ilha Banks, nos Territórios do Noroeste.

“[A bactéria] é comum em todo o mundo, mas não é normal que ela se manifeste no Ártico”, disse Cuyler. “Normalmente está dormente por causa das temperaturas frias. O aquecimento do Ártico está realmente mudando as coisas.” Além disso, os mamíferos que migram para o norte em busca de temperaturas mais altas também podem trazer novas doenças e parasitas que poderiam afetar espécies nativas sem proteção.

Segundo o relatório, essas espécies migrantes estão alterando as interações predador-presa no norte. Raposas vermelhas são conhecidas por competir pelas mesmas tocas que as raposas do Ártico e até mesmo matá-las. No Alasca, ursos marrons estão matando filhotes de boi almiscarado. “Isso é algo totalmente novo” que só foi visto nos últimos 20 anos, disse Cuyler. “E é devastador.”

Foto: Pixabay

Em última análise, à medida que as zonas climáticas e espécies se deslocam para o norte, o ecossistema terrestre do Ártico encolhe. “Eventos extremos – clima, incêndios florestais e surtos de insetos – deixarão sua marca por vários anos em um sistema como o Ártico”, disse Niels Martin Schmidt, pesquisador sênior da Universidade de Aarhus e colaborador do relatório, “porque tudo leva muito tempo para se regenerar”. Ele acrescentou que é necessário “monitoramento contínuo baseado em ecossistemas” para poder acompanhar essas mudanças ao longo do tempo.

“Precisamos entender como as espécies estão interagindo para entender por completo as consequências das mudanças climáticas na perda de biodiversidade.”

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