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Meio século de destruição: ações humanas causam extinção de espécies e devastação da natureza

23 de setembro de 2020
5 min. de leitura
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Um estudo, publicado em 15 de setembro na Nature Scientific Report, descobriu que mais de 56% das espécies de mamíferos que vivem em comunidade, ou grupos de espécies que coexistem, nos Neotrópicos, tem desparecido desde 1500, mais ou menos na época que a colonização europeia começou. As maiores perdas são vistas em espécies unguladas, como antas da região do sul (Tapirus terrestris) e o caititu (Tayassu pecari).

Os humanos são os grandes responsáveis por esta extensiva perda de vida selvagem, ou defaunação, devido ao excesso de caça, perda de habitat, queimadas acidentais e intencionais, e a introdução de espécies invasivas e doenças também colaboram para esse quadro.

Enquanto a vida selvagem e seu habitat tem continuamente decrescido desde o século XVI, as perdas têm se tornado mais intensas nos últimos 50 anos, de acordo com o co-autor Carlos Peres, professor de ecologia e conservação tropical na University of East Anglia (UEA) no Reino Unido.

“Nós tivemos um grande aumento na perda de habitat, o que coincide mais ou menos com a chegada das primeiras grandes estradas que ligaram o Amazonas ao resto do Brasil”, disse Peres ao Mongabay. “Como se sabe, a Amazônia era isolada do resto do Brasil até 1971, então isso é um grande marco em termos de desflorestamento tropical.”

O estudo, conduzido por pesquisadores da UEA e da Universidade de São Paulo (USP), usaram dados de mais de 1.029 estudos sobre os Neotrópicos em 23 países, desde o México até o Chile e a Argentina. Esses dados foram em sua maioria publicados no passado, a cerca de 30 a 40 anos atrás, mas as informações contemplam dados desde a época da colonização europeia.

O que os pesquisadores descobriram agora é que pressões antropogênicas, como perda de habitat e excesso de caça, foram as causas primárias da extinção local das espécies e da “diminuição de comunidades”, que se refere a redução no tamanho do grupo de cada população de certo mamífero.

“Qualquer espécie que seja removida da sua comunidade cria um espaço na ecologia e, consequentemente, uma falha no funcionamento do ecossistema”, Juliano Bogoni, que é pós doutorado na UEA e pesquisador líder deste projeto, disse ao Mongabay por e-mail. “Por exemplo, a perda de espécies de animais frugívoros de grande porte irá comprometer o processo de distribuição de sementes, de regeneração florestal, e causará mudanças na dinâmica fitodemográfica (como por exemplo a dinâmica da floresta e a dominância de algumas árvores). A perda de predadores do topo da cadeia-alimentar irá alterar de cima pra baixo o controle das presas e promoverá falhas no controle de doenças. Com a extinção local de uma espécie, o ecossistema também perde a sua variabilidade genética e seus papéis ecológicos (ou seja, a diversidade funcional).”

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Peres, que vêm pesquisando a subsistência da caça comercial nos trópicos das Américas ao longo dos últimos 40 anos, disse que as novas descobertas o surpreenderam.

“Eu já fui em mais sítios da Amazônia brasileira, fazendo estudos da vida selvagem, do que qualquer outro biologista que jamais viveu, seja este vivo hoje ou que já tenha morrido”, disse Peres. “Mas eu estou acostumado a ver apenas os locais onde os animais de grande porte são perdidos. O que nossa atividade tem mostrado é que existem várias extinções locais até mesmo de animais de médio porte.”

Os pesquisadores disseram que esperam que esse estudo possa ajudar a informar sobre os esforços de conservação nos Neotrópicos, particularmente na região da bacia do Amazonas e nas áreas alagadas do Pantanal, que são regiões ainda consideradas “intactas” quando falamos de fauna. Inversamente, regiões como a Mata Atlântica e a Caatinga tem se tornado tão degradadas que agora são consideradas como “ecossistemas vazios”, de acordo com o estudo.

Bogoni diz que esforços futuros de conservação deverão incluir a “implementação efetiva e o reforço da legislação nas áreas de proteção existentes, e conter a pressão política para ou diminuir ou ‘abaixar de nível’ estas áreas”. Adicionalmente, ele diz que ações precisam ser tomadas para parar com a caça ilegal, com o desmatamento e com os incêndios causados por humanos.

Enquanto o trabalho de conservação pode ajudar a proteger os biomas intactos das regiões da Amazônia e do Pantanal, as queimadas que estão atualmente acontecendo nestas áreas podem causar um efeito devastador na vida selvagem e em seus habitats, segundo Peres. A região do Pantanal tem sido brutalmente atingida já que ela “não deveria estar queimando”, ele diz.

“O Pantanal não tem visto uma queimada deste porte a muitos e muitos anos”, diz Peres. “Então há muita biomassa, muito combustível pra queimar. O que as pessoas tem reportado é…um grande número de carcaças de animais e um grande nível de mortalidade. As queimadas no Pantanal são muito, muito severas…e ainda não estão perto do fim. As pessoas comentam sobre uma chuva para as próximas semanas, mas nós não sabemos com certeza se essa chuva vai chegar aqui.”

Já que as descobertas do estudo claramente indicam que os humanos têm contribuído para a disseminação da defaunação nos Neotrópicos, o artigo termina com uma chamada para ação – e oferece um pingo de esperança.

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“Humanoides e outros mamíferos têm coexistido desde a o início do período Paleolítico onde os caçadores fabricavam ferramentas com pedras a cerda de 3 a 4 milhões de anos atrás”, escreve o autor. “Ao longo dessa enorme linha do tempo, a perda de biodiversidade tem sido acelerada recentemente a níveis muito rápidos desde a revolução industrial. Vamos nos assegurar que grande parte deste empobrecimento fique para trás da gente e não no nosso futuro, é isso ou a prospecção de mamíferos neotropicais parecerá incrivelmente desoladora”.


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