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Psicóloga aborda a importância do autocuidado para veganos

7 de junho de 2020
8 min. de leitura
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A psicóloga vegana Fernanda Fonseca é conhecida no Instagram por seu perfil onde aborda saúde mental e defesa dos direitos animais. Psicoterapeuta e especialista em Psicomotricidade Relacional, ela pesquisa a importância do autocuidado para veganos e para auxiliar esse processo, a profissional, que tem mais de 10 anos de experiência, escreveu em e-book para auxiliar a trajetória de todos que adotaram a filosofia vegana ou aqueles que desejamo optar por estilo de vida compassivo que abole todo tipo de crueldade e exploração contra animais.

Fernanda desmitifica teorias que relacionam veganismo e desequilíbrios mentais Foto: Divulgação

Fernanda faz uma conexão com a sua própria experiência. Em uma entrevista exclusiva à ANDA, ela explica como aconteceu o seu despertar. “Quando eu era criança, sofri muito ao descobrir que nos alimentávamos de animais, tive um pintinho, que eu amava, mas um dia, minha mãe o doou para outra pessoa, que me contou que o estava criando para que quando ele crescesse, virasse comida. Isso me marcou bastante, lembro que eu chorei de soluçar, virou um trauma. Hoje, consigo compreender o impacto disso, pois naquela época, me tornei emocionalmente mais distante dos animais”, disse.

A psicoterapeuta conta ainda como o amor pelos animais a incentivou a buscar a filosofia vegana. “Assim que tive uma cachorra, pude recuperar parte do meu interesse por animais. Durante os nove anos de vida dela, me ensinou muitas coisas sobre diversão, cuidado, atenção, carinho e amor. Tenho certeza que isso foi essencial para o meu desenvolvimento. Mas só me tornei vegana na vida adulta, aos 29 anos, no ano de 2013. Uma decisão que eu considero tardia, já que o desejo existia dentro de mim há muito tempo, mas eu não o reconhecia, e tampouco sabia onde buscar orientação para fazer isso acontecer. Foi uma das melhores decisões da minha vida”, afirma.

Consultório

A profissional explica que entre os assuntos abordados por pacientes veganos estão a empatia pelos mais indefesos e o isolamento. “Na maior parte do tempo, falam de outras questões que não estão relacionadas ao veganismo, mas inevitavelmente em algum momento, acabam por tratar deste assunto, ao compartilhar experiências de solidão, ou mesmo sentimentos de desespero, com o que ocorre com os animais. E a minha preocupação é que, por mais que este assunto não seja o foco da terapia, é fundamental que ao ser abordado, os terapeutas possam oferecer o devido apoio profissional, porque são queixas como outra qualquer”, aponta.

E completa: “Se desconsiderarmos esta fala, por exemplo, dizendo que a pessoa está exagerando, ou seja, não acolher, reprimir e criticar o que a pessoa está sentindo, estaremos contribuindo para que ela tenha uma experiência negativa em terapia, e reforçando o sentimento de se sentir incompreendida, o que poderá enfraquecer o vínculo terapêutico e fazê-la se sentir mais sozinha, e ainda deixar de fazer progressos. Por outro lado, se somos veganos, e nos conectamos excessivamente com aquele conteúdo emocional, sem conhecermos estratégias apropriadas para isso, também não teremos condições de oferecer o melhor tipo de acompanhamento”, esclarece.

Desafios

Fernanda fala também sobre as dificuldades que o veganos enfrentam socialmente. “Os desafios são diversos, pois o mundo (ainda) não é vegano. Inicialmente, é comum vivenciar uma crise de revolta, tristeza e desgosto. E o que antes costumava fluir tranquilamente, agora já passa a ter novos conflitos, desde pequenas discordâncias, podendo chegar até possíveis problemas crônicos em relacionamentos familiares ou amorosos”, acredita.

E acrescenta: “A boa notícia é que, geralmente, isso pode ser melhor administrado quando veganos aprendem a buscar (e a receber) apoio (ao veganismo) das pessoas mais próximas. Isso contribui muito mais para a autoconfiança e segurança da pessoa vegana, que não se sentirá julgada, desprotegida ou criticada pelas suas escolhas. Então, a falta de compreensão e apoio ao movimento vegano como um todo é o que mais parece sobrecarregar os veganos”, analisa.

Ética nos atendimentos

Apesar de ser vegana, a psicóloga tem muitos pacientes onívoros e isso não prejudica em nada as consultas. “Atendo muitas pessoas onívoras. Nenhum atendimento é igual ao outro, porque as pessoas são sempre diferentes. Enquanto psicoterapeuta, eu não tenho o direito de ficar expondo as minhas opiniões durante os atendimentos. Procuro ser a mais neutra possível, porque tenho que ficar atenta as necessidades que o paciente escolhe trabalhar. Mas, dependendo da situação, posso falar sobre isso. Não para impor minhas opiniões para a pessoa, até porque este é um processo que visa libertar o indivíduo, então, ele não pode ficar sob o meu controle”, aponta.

Ela conta ainda que muitos pacientes demonstram interesse pelo veganismo. “Já teve casos de pacientes que descobriram que sou vegana, e decidiram me fazer algumas perguntas sobre isso, e geralmente não vejo problema em termos conversas extras à sessão, é agradável, mas não posso criar uma nova demanda para a vida daquele paciente. A não ser que ele venha pelo serviço de coaching de transição para o veganismo, que é um serviço que eu também ofereço”, disse.

Empatia pelos animais

A profissional aborda também como veganos podem manter a saúde mental diante do reconhecimento do sofrimento animal. “Esta pergunta me faz lembrar da seguinte frase: a dor é inevitável, mas o sofrimento é opcional. Muitas pessoas, após assistirem a vídeos de violência animal, se conectam com o sofrimento daqueles animais, e assim, ficam extremamente comovidas com as imagens. Portanto, o simples fato de assistir, já gera um impacto emocional, pois se trata de um conteúdo difícil, pesado. Por questões de saúde mental, o recomendável é que você diminua sua exposição a vídeos de violência, porque mesmo que aquelas tragédias não atinjam diretamente a você, é provável que você se traumatize em algum nível só pelo fato de assistir acontecer à terceiros”, afirma.

E completa dando valiosas dicas: “É importante se distrair, ter momentos de lazer, e investir em momentos agradáveis, para tirar o foco do negativo. Não quero dizer com isso, que você deve negar a dor. Esta precisa ser reconhecida e elaborada. Porém, este não pode ser o seu cerne, senão poderá acabar em sofrimento. E se o sofrimento toma conta, a motivação e a produtividade cai. E uma das formas de se manter bem, é buscando ter mais emoções positivas do que negativas, é aprendendo a priorizar o que pode dar certo, em detrimento do que está indo mal”, disse.

“Tudo é impermanente”

Fernanda desmitifica também teorias que apontam desvios psicológicos em veganos. “Desconheço esta conexão. Se formos analisar em termos alimentares, uma alimentação saudável (vegetariana estrita), contribui para melhores níveis de bem-estar e menor risco de depressão e outros transtornos mentais. Mas em relação a vivência dos veganos, é necessário um cuidado assim como é necessário atenção ao passar por outras mudanças de vida. Por exemplo, há pessoas que desenvolvem uma depressão após uma mudança de bairro”, explica.

E acrescenta: “por melhor que as mudanças sejam, elas inicialmente elevam o nosso estresse. E quando alguém se torna vegano, são muitas as mudanças que acontecem, boas e ruins. Algumas que precisamos nos adaptar e aceitar, enquanto outras, precisamos nos fortalecer emocionalmente e nos recuperar. Nesta caminhada temos muitas alegrias, mas também muitas frustrações. Mas exatamente como tudo na vida. E nada disso deve ser temido, pois no mundo, tudo é impermanente”, assevera.

Cuide-se

A psicóloga afirma que o veganismo “vai além das questões alimentares e de saúde”  e fala sobre as motivações que a levaram a produzir o e-book Autocuidado para Veganos: “Veganos tendem a focar muito sua atenção para fatores externos como a libertação animal. Com isso, podem se negligenciar, por acreditarem que os animais precisam muito mais de ajuda. O que não é uma total inverdade, já que os animais estão desproporcionalmente mais em desvantagem do que seres humanos. Porém, como você vai contribuir para a mudança do mundo, se você sequer está se cuidando? Se você foca em salvar o mundo, mas se esquece de si, você mais perde do que ganha”, disse.

E completa: “Para você contribuir para o mundo, você precisa em primeiro lugar, se cuidar, porque é quando estamos bem, que temos condições de raciocinarmos melhor, regularmos mais as nossas emoções, e termos atitudes mais assertivas.Então, o movimento vegano possui tantos objetivos, mas quem cuida dos veganos? Pensando nisso, escrevi este manual para veganos reconhecerem o valor do autocuidado, para que a experiência do veganismo não seja um sacrifício, mas sim uma oportunidade de transformação e resiliência para suas vidas também”, alerta.

Transição

Fernanda finaliza com uma mensagem otimista para todos que desejam conhecer e adotar a filosofia vegana: “Participe de comunidades veganas, crie uma rede de apoio ou fique mais próximo de quem é vegano, copie receitas, comportamentos, vá se familiarizando com o assunto. Procure ler e assistir videos e documentários sobre o assunto. Seja otimista, se quiser aderir ao veganismo. Porque se você já entra pensando que não irá conseguir, provavelmente não terá bons resultados. Não seja perfeccionista, você terá recaídas e dificuldades, mas isso não significa que está indo mal. Tenha foco no que é importante para você. E tenha persistência, você ainda irá conseguir. Dê o seu melhor”, conclui.

Baixe o e-book: E.book.Autocuidado.para.veganos.18.05 (1)


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