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Justiça ambiental significa justiça racial, dizem ativistas

25 de junho de 2020
6 min. de leitura
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Pixabay

O enfrentamento do racismo sistêmico é fundamental para alcançar a justiça ambiental e climática, defendem os principais ativistas do tema, à medida que as disparidades da pandemia da Covid-19 e a revolta global contra a brutalidade policial revelam as ramificações das desigualdades raciais por todas as esferas da vida.

Uma onda de protestos exigindo o fim do policiamento racista ocorreu em cidades grandes e pequenas por todo o mundo em meio a evidências crescentes de que comunidades pardas, negras e indígenas também foram desproporcionalmente impactadas pela pandemia do coronavírus.

Cada vez mais, especialistas e manifestantes têm identificado a injustiça racial como denominador comum entre a violência policial e as desigualdades ambientais e de saúde ligadas aos efeitos negativos da Covid-19. Ao mesmo tempo, nas ruas, o que começou como protestos Black Lives Matter se transformou em um movimento por justiça racial em meio ao crescente reconhecimento de que o racismo sistêmico nega às pessoas de cor o acesso igualitário à justiça econômica, social, ambiental e climática, negando, também, a equidade em saúde, poder político, direitos civis e direitos humanos.

“As taxas desproporcionais de infecção [por Covid-19], hospitalização e mortes estão ligadas à não equidades raciais persistente e duradouras nas áreas de saúde, social, econômica e ambiental enfrentadas pelos negros americanos. Essas condições estão enraizadas na opressão, na discriminação, no apartheid médico e no racismo estrutural (…) e que hoje criaram uma ‘tempestade perfeita’”, disse Peggy Shepard, co-fundadora do WE ACT for Environmental Justice (Organização Nós Agimos pela Justiça Ambiental), em uma coletiva de imprensa esta semana.

Nos EUA e no Reino Unido, pesquisas descobriram que pessoas de cor estão mais susceptíveis à poluição do ar do que os residentes brancos desde mesmos países. A má qualidade do ar está ligada a várias condições respiratórias e cardiovasculares, o que aumenta significativamente o risco de morte por Covid-19.

As multidões cresceram, assim como as demandas por reformas radicais.
“O racismo está incorporado ao DNA da América, e desde 1619, os negros americanos tiveram que suportar esse sistema violento e opressivo (…) A Covid 19 expôs a divisão racial de nossa nação”, disse Robert Bullard, distinto professor de planejamento urbano e política ambiental na Texas Southern University e co-presidente da National Black Environmental Justice Network (NBEJN – Rede Nacional de Justiça Ambiental Negra).

A NBEJN, uma organização fundada em 1999 para abordar o racismo ambiental enfrentado pelas comunidades negras em todo os EUA, foi relançada esta semana com a promessa de criar um roteiro para uma ampla agenda de justiça ambiental vista através da lente da justiça racial.
“O racismo ambiental mata, a poluição do ar e o desmantelamento das regulamentações de proteção ambiental dificultam a respiração dos negros. Na NBEJN estamos ligando os pontos”, disse Bullard

Por todo o mundo, os movimentos ambientalistas e climáticos há muito tempo vêm enfrentando críticas por não compreenderem o papel crucial da justiça racial em termos de impactos e de soluções.

Nos EUA, o movimento por justiça ambiental surgiu na década de 1980, em parte porque nem grupos de ambientalistas dominados por brancos nem grupos de direitos civis consideravam como parte de sua agenda o despejo desproporcional de resíduos tóxicos em bairros negros.

O nascimento do movimento foi consolidado em 1991 na primeira cúpula nacional de liderança ambiental das populações de cor, com a presença de acadêmicos e líderes de comunidades negras, latinas, nativas-americanas e asiáticas-americanas, incluindo Robert Bullard, quem elaborou 17 princípios da justiça ambiental.

O Reino Unido ficou para trás. No entanto, os protestos generalizados em solidariedade ao movimento Black Lives Matter também evoluíram para um acerto de contas com o passado e o presente racistas da Grã-Bretanha – inclusive dentro do movimento ambientalista.

Rosamund Kissi-Debrah, é uma porta-voz para assuntos de saúde e qualidade do ar da Organização Mundial da Saúde e tem feito campanhas pela maior conscientização e pelo controle mais rigoroso da poluição desde a morte de sua filha, Ella, de nove anos em Londres, em decorrência de uma forma rara de asma. Ela foi uma das muitas críticas de uma revisão da Saúde Pública realizada na Inglaterra que não considerou a poluição do ar entre os fatores causadores da maior taxa de mortes por coronavírus entre as pessoas do grupo BAME (Negros, Asiáticos e Minorias Étnicas).

Kissi-Debrah disse que muitos ativistas BAME sentem que não recebem a mesma plataforma e acesso a recursos. “Acho que tenho que trabalhar mais. Não tenho ressentimentos. É assim que as coisas são. Deveria ser assim? Provavelmente não”, disse ela.

A desigualdade de renda e a insegurança do emprego também têm participação neste fenômeno. Kissi-Debrah diz que os negros no Reino Unido são menos abastados do que outros grupos étnicos, e menos propensos a ter tempo livre para participar de reuniões, protestos ou ações de lobby.

Madhu Krishnan, professora de literaturas africanas, mundiais e comparativas na Universidade de Bristol e apoiadora do movimento climático, disse que havia muitos ativistas negros do clima em sua cidade, particularmente no Extinction Rebellion, mas ainda assim, havia uma percepção geral de que a grande maioria era branca e de classe média.

“Se você observar globalmente o que aconteceu com o clima, uma quantidade desproporcional de culpa deve ser destinada ao norte do globo, especialmente às antigas potências coloniais. As indenizações ambientais são devidas”, disse Krishnan. “E preciso dar mais atenção às soluções. A ideia de créditos de carbono simplesmente remonta a estruturas coloniais.”
Daze Aghaji (ativista de 19 anos que concorreu ao Parlamento Europeu) concorda que novos grupos como o Extinction Rebellion são mais inclusivos e abertos a mudanças do que organizações tradicionais como o Greenpeace.

“Nas últimas semanas, os protestos têm realmente ajudando. As pessoas estão mais abertas a ouvir. Isso fez que as pessoas percebessem que os EUA não são o único país com um problema sistêmico de racismo”, disse ela. “Precisamos de um momento para realmente pensar em como nos relacionamos um com o outro…Este sistema tóxico é algo com o que todos temos que conviver.”

Enquanto manifestantes e ativistas exigem que os líderes mundiais também liguem os pontos, Ayana Johnson, oceanógrafa de Nova York, fundadora do Ocean Collective, uma organização sem fins lucrativos focada na justiça social, sucintamente relacionou a justiça racial à justiça climática em uma mensagem de vídeo postada no Twitter.

“Para as pessoas brancas que se preocupam em manter um planeta habitável, eu preciso que vocês sejam ativamente antirracistas. Preciso que entendam que nossa crise de desigualdade está entrelaçada com a crise climática. Se não trabalharmos em ambas as frentes, não teremos sucesso em nenhuma delas”, conclui.


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