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'Meu coração se enche de orgulho', diz mãe sobre filha vegana de três anos

28 de maio de 2020
9 min. de leitura
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O veganismo pode ser adotado em qualquer fase da vida, inclusive na infância – conforme já foi explicado pela nutricionista Ana Ceregatti, em entrevista à ANDA. Uma prova disso é Eva. Com apenas três anos, a filha da advogada Melina Valério, de Piracicaba (SP), nunca se alimentou de produtos de origem animal. Vegana desde à gestação, a menina já entende que animais não foram feitos para consumo humano e sim para “amar, cuidar e respeitar”. Em entrevista exclusiva à ANDA, Melina contou um pouco sobre a criação da filha dentro do veganismo. Confira abaixo.

Foto: Melina Valério/Arquivo Pessoal

ANDA: Desde quando você é vegana e como foi ter uma gestação vegana?

Melina Valério: Sou vegana desde 2014. Engravidei no início de 2016. A gestação foi maravilhosa. Eu já tinha hábitos de vida saudáveis, praticava esportes e me alimentava bem. Nunca tive qualquer problema durante a gestação, exames de sangue e ultrassons sempre apresentaram ótimos resultados. Tanto que pratiquei atividades físicas normalmente até 8,5 meses de gestação. Só depois disso fiquei somente com caminhada e yoga, coisas mais leves porque o peso da barriga já não permitia atividades mais intensas.

ANDA: Sua filha se adaptou bem ao veganismo?

Melina Valério: Superbem. Ela já nasceu adaptada né, afinal, desde a concepção, foi o tempo todo alimentada somente com comida vegana. E foi assim, passando pelo nascimento até hoje. Ela nasceu com 3,995kg (o que é bastante para uma menina) e 51,5cm, ou seja, bem grandinha e forte.

Foto: Melina Valério/Arquivo Pessoal

ANDA: Embora sua filha ainda seja bastante nova, ela já entende algo a respeito da ideia de que devemos proteger os animais?

Melina Valério: Sim, desde a barriga eu sempre conversei muito com ela. Eu não colocava muita fé nisso de “conversar com a barriga”, mas sempre me diziam que era muito importante fazer. Eu falava sempre. Cheguei a resgatar uma porca quando estava com 35 semanas de gestação dela. Todos os dias eu ia contando pra ela os cuidados com a porca, hoje falo pra ela até que ela participou do resgate, rs. Eu sempre expliquei de forma lúdica. Não dá pra jogar a realidade nua e crua nas costas de uma criança tão pequena. Então, sempre fui falando que animais são nossos amigos e que devemos amá-los, respeitá-los e cuidar deles. Ela sempre entendeu isso muito bem, que bicho é bicho e comida é comida. Eu digo a ela que se a gente comer alguma coisa que vem dos bichinhos, vai fazer dodói neles. É incrível como as crianças assimilam muito bem dessa forma. Na cabecinha dela nunca houve qualquer confusão. Quando pergunto a ela “Eva, o que a gente deve fazer com os animais?”, ela imediatamente responde “amar, cuidar e respeitar”.

ANDA: Você sofreu preconceito ou enfrentou alguma dificuldade com amigos, parentes ou conhecidos por criar sua filha dentro do veganismo?

Melina Valério: Diretamente, nunca. Mas eu sabia que por trás as pessoas comentavam. Soube que havia na família preocupações do tipo “será que não vai faltar nada para a criança?” . Mas o tempo, por si só, acredito que trouxe essa resposta a essas pessoas. Como já disse, Eva nasceu grande e forte. Nunca tive qualquer problema durante a gravidez. Hoje, com 3 anos, ela é uma criança completamente saudável. Nunca precisou ir a um hospital ou pronto-socorro. As visitas à pediatra (vegana também, por sinal, rs) são apenas visitas de rotina, com exames de rotina, que até então sempre trouxeram bons resultados. Também a levo em nutricionista (vegana também, rs) desde que ela nasceu. Claro que ela já teve gripes, resfriados, febrinhas, como qualquer criança. Mas a homeopatia normalmente sempre deu conta e ela se recupera super rápido. Tem uma resistência muito boa e um desenvolvimento absolutamente normal, como qualquer criança.

Foto: Melina Valério/Arquivo Pessoal

ANDA: Você contou com a ajuda de especialistas para aprender sobre a forma correta de alimentar sua filha de forma saudável apenas com vegetais ou aprendeu por conta própria?

Melina Valério: Eu sempre dei muito valor aos nutricionistas. Sempre acreditei que se déssemos mais valor a esse profissional, talvez nossa sociedade não fosse tão doente e não precisasse tanto de médicos. Vou em nutricionistas há anos e faço questão de levar a Eva junto. Por isso, suplementar B12, tomar os devidos cuidados com o cozimento de leguminosas para aproveitar melhor o ferro delas, combinação de alimentos (como associar o consumo de feijões e folhas escuras a alguma fonte de vitamina C), por exemplo, sempre foram práticas habituais no meu dia a dia, e que naturalmente contribuíram para uma gestação saudável, e consequentemente para a criação de uma criança vegana e saudável. Claro que eu também sempre fui muito curiosa e sempre leio muito sobre alimentação, mas jamais deixo o hábito de visitar minha nutricionista regularmente. Ainda mais que minha filha, por estar em fase de crescimento, tem necessidades diferentes das minhas.

ANDA: Sua filha vai à escola? Se sim, você enfrenta ou já enfrentou alguma dificuldade para que a opção alimentar dela fosse respeitada?

Melina Valério: Sei que a minha realidade é um pouco diferente de outras mães veganas que conheço. Eu, particularmente, não posso reclamar. A escola da minha filha sempre foi muito aberta e as educadoras lá sempre se mostraram muito dispostas a fazer as adaptações para a Eva. E não era só com alimentação. A Eva também usava fraldas de pano, que não são testadas em animais e não agridem o meio ambiente como as descartáveis. A escolha por fraldas assim também é uma postura vegana. A escola dela aceitou essas duas coisas muito bem.

Foto: Melina Valério/Arquivo Pessoal

No começo, as professoras tinham mais dúvidas. Qual pão poderia dar a ela, qual macarrão, como fazer bolo sem ovo (coisa mais fácil do mundo rs), dentre outras. Eu sempre fui explicando com a maior boa vontade e amor. Hoje, coisas como homus e danoninho de inhame acabaram entrando para o cardápio. Eram coisas que faziam para a Eva e que gostaram tanto que acabaram oferecendo às outras crianças.

Nos aniversários dentro da escola, servem bolo, pipoca e pão de queijo. Eu sempre mandava o bolo dela e pão de “beijo” (feito com batata doce e mandioquinha) congelado. Certa vez eu esqueci de mandar o bolo. Elas se viraram lá e fizeram um bolo sem ovo, colocaram mais banana. A professora me contou depois que ficou bem melhor que o que elas faziam e esse acabou virando o bolo oficial agora, rs. E assim vai, de pouquinho em pouquinho, vamos plantando essa semente nas escolas. Mas confesso que nesse ponto tive muita sorte. Infelizmente, sei de muitas mães veganas que não têm sua opção tão respeitada assim nas escolas de seus filhos.

Foto: Melina Valério/Arquivo Pessoal

ANDA: Como é para você criar uma criança seguindo os preceitos do veganismo?

Melina Valério: Não vou dizer que seja fácil, porque não é. O mais simples é a própria criança em si. Elas já nascem com uma empatia natural por animais. Desde que nascem, os animais já fazem parte da vida delas, nas roupas, nos brinquedos, nos desenhos, em tudo. Para quem tem animal em casa então, é ainda mais fácil. A empatia delas é nata, não é algo que precisa ser desenvolvido nelas. Nesse sentido, não é nem um pouco difícil explicar que animais são amigos e não comida. Que tem coisas que não comemos porque faz dodói nos animais. Eva sempre compreendeu isso de uma maneira incrivelmente simples e natural, como toda criança vegana que conheço.

O difícil mesmo é a sociedade. É essa criança ver as pessoas que ela mais admira se alimentando de animais e te perguntar o porquê. É você levá-la em festas infantis e ter que levar uma marmita junto para ela não passar vontade daquilo que as outras crianças estão comendo, e que dificilmente será algo vegano. Você levar a um parque de diversões, e saber que a grande maioria das guloseimas de lá não serão veganas. Você explicar porque ela não irá a um zoológico com os amigos da escola, ou no passeio para as famosas “fazendinhas”, dentre muitas outras. Claro que ainda não vivenciei todas essas situações, mas procuro não “pirar” e deixar para lidar com cada uma dessas situações conforme forem surgindo.

Foto: Melina Valério/Arquivo Pessoal

Ela ainda tem 3 anos, então ainda tem muitos desafios que viveremos juntas nessa sociedade que ainda é bem difícil para nós, que escolhemos ser diferentes e falar não para tudo de errado que fazemos com os animais. Mas o caminho que sigo, e que tem dado muito certo por enquanto, é o do diálogo. Eu converso muito com ela e me surpreendo cada vez mais com a facilidade com que ela entende e assimila. Sabendo que a empatia é natural na criança, o caminho é esse. E é dessa forma que sempre conto a verdade a ela, e digo que para tudo aquilo que as pessoas fazem e comem e nós não, sempre haverá uma opção vegana pra gente. Mais legal, mais gostosa, e que não faz dodói nos animais.

Acredito que assim vai dando certo. E meu coração se enche de orgulho quando oferecem algo a ela e ela olha pra mim e diz “mamãe, isso é vegano?”. Com apenas 3 anos. Então não, não é fácil. Mas dia após dia, vivendo um desafio de cada vez, e sempre apostando no diálogo e na empatia natural, é o caminho que tem dado certo pra mim.

Foto: Melina Valério/Arquivo Pessoal

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