EnglishEspañolPortuguês

Pica-paus que vivem em São Paulo correm risco de extinção

21 de janeiro de 2019
3 min. de leitura
A-
A+

Primeiro foram as ararinhas-azuis. Agora são os pica-paus que estão ameaçados de extinção no Brasil, sobretudo na cidade de São Paulo, uma selva de pedra que destina cada vez menos espaço para essas aves.

Foto: Rudimar Narciso

Elas têm como habitat as frondosas árvores, com troncos circundados por grossas camadas de cascas, como os jacarandás, que estão desaparecendo da cena urbana.

O ornitólogo Dalgas Frisch, com 88 anos, 81 deles dedicados aos pássaros brasileiros, está empenhado em salvar os pica-paus desse lento e gradual processo de desaparecimento em São Paulo. Como Dalgas mora ao lado da Reserva Ecológica do Morumbi, uma mata com 24 hectares no coração de São Paulo, ao lado do Palácio dos Bandeirantes, ele percebeu que os pica-paus, antes abundantes na região, estão rareando. Por isso, há dois anos começou a estudar o fenômeno, acompanhando o dia a dia desses pássaros, com fotografias e filmagens. Afinal, no México os pica-paus já estão praticamente extintos, tanto em função do desmatamento como pelo fato de que os moradores acreditavam que suas penas tinham propriedades medicinais (a fumaça com a queima das plumagens ajudava mulheres a suportar as dores do parto).

Mas, em São Paulo, a ameaça maior vem da Prefeitura, segundo ele. Os funcionários de parques e jardins vêm dedetizando com inseticidas as árvores para matar cupins e esse veneno é letal para esse tipo de pássaro, que têm por hábito perfurar as árvores com o bico para encontrar insetos que os alimentam ou até mesmo a fazer seus ninhos nos buracos “cavados” por eles nos troncos. Além disso, a Prefeitura vem substituindo os Jacarandás por plantas de textura lisa, onde os pássaros não conseguem se “segurar” para poder furar as árvores. Ele garante que vai procurar o prefeito Bruno Covas para expor o problema.

Dalgas acabou descobrindo uma coisa também importante para a sobrevida dos pica-paus. “Como esses pássaros fixam as patinhas nas árvores para fazer os furos com os potentes bicos, eles usam as asas e caudas, chamadas tecnicamente de remiges e retrizes, para se apoiar nas árvores. Mas as asas e caudas acabam ficando grudadas pela resina absorvida das plantas. Se elas não se livram das resinas, não conseguem apoio para a fixação às plantas em novas operações, e podem morrer”, diz o ornitólogo. Dalgas percebeu que esses pássaros necessitam banhar-se para retirar a resina das asas com bastante frequência. Recomenda que moradores em áreas habitadas pelos pica-paus implantem recipientes com água para permitir o acesso dos pássaros ao banho diário, hábito que já adota em sua casa no Morumbi.

Um estudo completo sobre essa constatação está sendo preparado para publicação na revista Nature, no Reino Unido. “Ainda podemos salvar o pica-pau paulistano da extinção”, resume Dalgas. A dedicação a esse estudo foi tamanha que Dalgas caiu, em junho último, de uma enorme escada que ele instalou para fotografar de perto os pica-paus que observa no Morumbi. Resultado: fraturou o crânio e ficou dois meses internado no Hospital Albert Einstein, entre a vida e a morte.

Sobre Dalgas Frisch

Dalgas é uma referência mundial para a ornitologia brasileira. Nascido em São Paulo, embora filho de dinamarquês, ele acaba de receber o título de cidadão da Dinamarca pelos relevantes serviços em prol da preservação da fauna e flora, inclusive da Amazônia, principalmente por ter contribuído para a demarcação do Parque do Tumucumaque, com 10 milhões de hectares, encravado entre as florestas amazônicas do Brasil, Suriname e Guiana Francesa, uma área maior do que o território de Portugal (9,2 milhões de hectares).

Foi nessas florestas, inclusive, no Acre, que o ornitólogo fotografou e gravou o som dos sete cantos do Uirapuru, um pássaro que só vive na Amazônia (ver box em anexo). Só ele, em todo o mundo, conseguiu essa façanha. Mas quem acha que o velho Dalgas aposentou-se e que só vive das glórias do passado, não imagina do que ele é capaz para manter o sangue de pássaros correndo em suas veias. Ele é praticamente um homem pássaro.

Fonte: IstoÉ

Você viu?

Ir para o topo