Um relatório tendencioso do Serviço de Vigilância Agropecuária (SAV) afirma que os 25 mil bois que estão embarcados no navio NADA, no Porto de Santos, no litoral paulista, estão saudáveis e que a embarcação tem boas condições sanitárias.
As alegações do SAV, que é integrado ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), é contestada não só pelos ativistas, que fizeram registros, por meio de fotos e vídeos, da crueldade imposta aos animais, como também pela Secretária Municipal de Meio Ambiente de Santos, que multou a Minerva Foods, empresa responsável pelo embarque dos bois, em R$ 1.469.118 por maus-tratos aos animais, e ainda pela médica veterinária Magda Regina, que concluiu “que a prática de transporte marítimo de animais por longas distancias está intrínseca e inerentemente relacionado à causação de crueldade, sofrimento, dor, indignidade e corrupção do bem-estar animal sob diversas formas”.
O que foram consideradas “boas condições sanitárias” pela Vigilância Agropecuária, foi classificada por Magda como “um cenário de intensa insalubridade”. A médica veterinária relatou ter se deparado, no interior do navio, com um ambiente repleto de fezes e urina que provoca odor amoniacal “extremamente intenso tornando difícil a respiração” e superlotado a ponto de comprometer severamente a mobilidade dos bois. Também foi relatado o fato da estrutura do navio ser inadequada, o que possibilita a ocorrência de acidentes, que também podem acontecer devido aos “movimentos pendulares da embarcação” e a diminuição do espaço, que acontece quando algum animal, exausto, deita no chão, causando mais limitação aos outros bois e facilitando, assim, “a ocorrência de tombos ou acidentes assemelhados”. A presença de ventilação, níveis de temperatura e umidade inadequadas na embarcação também foram descritas. As mortes, frequentemente registradas em longas viagens, foram comentadas pela médica veterinária. De acordo com Magda, “o óbito de animais está intrinsicamente ligado à prática de transporte marítimo de carga viva”.
Os maus-tratos, apontados pela médica veterinária, não foram encontrados durante a vistoria realizada pelo SAV, segundo os fiscais que realizaram inspeção técnica juntamente com a veterinária. Os resultados obtidos pelos profissionais, entretanto, é bastante diferente. Comprometida com o bem-estar animal, Magda produziu um laudo, com fotos apresentadas como prova, que relata detalhadamente a crueldade sofrida pelos animais. Os fiscais da Vigilância Agropecuária, entretanto, produziram um relatório tendencioso e parcial, que ignora o bem-estar animal e defende a pecuária a qualquer custo.
Entenda o caso
Os bois, criados em fazendas no interior de São Paulo, distantes 500 quilômetros de Santos, foram transportados em caminhões superlotados – com 27 a 38 animais cada – até o porto, onde foram embarcados no navio NADA, que seguiria viagem com destino a Turquia. O embarque foi realizado de 26 a 31 de janeiro.
Graças a uma ação civil pública movida pela Agência de Notícias de Direitos Animais (ANDA) em parceria com a Associação de Proteção Animal de Itanhaém (AIPA), os embarques foram suspensos. Ao acatar o pedido de suspensão dos embarques, o desembargador Luis Fernando Nishi atendeu integralmente às solicitações da ação, que incluíam o desembarque dos bois que foram colocados no navio, com posterior transferência para local seguro e adequado, e também o impedimento da embarcação zarpar do porto. Tais solicitações foram reforçadas por ordem judicial emitida pelo juiz Marcio Krammer de Lima, que determinou ainda, para a hipótese de descumprimento, ” multa de R$ 5.000.000,00 (cinco milhões de reais) por navio”.
A Minerva Foods, maior exportadora de bois vivos do Brasil, foi multada pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Santos em mais de R$ 3,4 milhões, sendo R$ 1.469.118 por maus-tratos e poluição ambiental, por despejar dejetos dos animais em via pública, e R$ 2 milhões também por poluição ambiental, devido ao forte odor que atingiu a cidade de Santos emitido pelo estrume dos animais mantidos na embarcação.
Caso será decidido pela Justiça Federal
O ministro Gurgel de Faria, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), decidiu, na noite de sexta-feira (2), que as decisões sobre o caso devem ser tomadas apenas pela Justiça Federal, tendo designado a 25ª Vara Federal de São Paulo para dar andamento às questões.
A decisão do ministro invalida a determinação tomada pela Justiça Estadual, de desembarque dos bois, mas mantém suspenso o embarque, a proibição de liberação da embarcação, que está retida no cais santista, e a ordem de desembarque dos animais, conforme decisão do juiz federal Djalma Moreira Gomes, que estabeleceu a suspensão das operações não só no Porto de Santos, mas nos portos de todo o território nacional.
A Turquia, país que iria receber os bois nas próximas semanas e matá-los de forma cruel – fazendo uso de uma faca bem afiada que os mataria ainda conscientes -, enviou uma equipe do Consulado Geral da Turquia em São Paulo ao Porto de Santos para participar de uma reunião sobre o impasse.