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Nova crueldade: caçadores matam leões resgatados de circos

19 de novembro de 2017
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José e Liso
José e Liso/ Foto: Animal Defenders International

Dois dos leões, José e Liso, mantidos na área de necessidades especiais do Emoya Big Cat Sanctuary, fizeram amizade rapidamente. Liso procurava por José, que sofreu danos cerebrais causados por golpes na cabeça enquanto era explorado por um circo, e o guiava pelo seu recinto.

Com um tratamento bondoso em seu novo lar, os leões logo se tranquilizaram. Entretanto, nas primeiras horas do dia 29 de Maio deste ano, ocorreu uma tragédia: caçadores entraram no santuário, envenenaram José e Liso e arrancaram suas cabeças, rabos, patas e peles.

Os assassinatos parecem ser uma nova tendência: caçadores perseguem leões em santuários, reservas naturais privadas e fazendas para obter as partes dos corpos dos animais. Os ossos de leão são procurados na Ásia para serem utilizados na medicina tradicional – como tônicos e vinhos para a saúde – e cada vez mais como substitutos de remédios produzidos com os ossos dos tigres, cujo número na natureza é de aproximadamente 3900 indivíduos.

Dentes e garras de leão também possuem uma alta demanda na China e em outros lugares da Ásia são usados como colares e outros objetos. Em alguns países africanos, as cabeças, os rabos e as patas são preferidos pela medicina tradicional, conhecida como muti.

“Isso realmente nos chocou. Vivemos com eles por um longo período. Fizemos muita reabilitação individual com eles”, afirmou Tim Phillips, co-fundador da Animal Defender, sobre as mortes de José e Liso. Ele diz que a principal prioridade agora é encontrar os assassinos dos leões: “Eles mexeram com as piores pessoas possíveis, mataram dois membros da família ADI e não iremos esquecer isso”.

A Animal Defenders International tem trabalhado com policiais na África do Sul e reunido informações sobre outros ataques contra leões em cativeiro em propriedades privadas. Em 2015, não havia nenhum. “Em 2016, os ataques começaram e continuaram crescendo. São parte de um padrão terrível”, disse Phillips.

José e Liso deitados ao lado um do outro
Foto: Animal Defenders International

De acordo com o grupo, pelo menos 20 leões confinados, incluindo José e Liso, foram mortos ou alvos na província de Limpopo, no Nordeste do país, nos primeiros oito meses de 2017. Durante 2016, 18 ataques foram reportados e a maioria das vítimas foi envenenada e mutilada e teve a cabeça, as patas e outras partes arrancadas.

Paul Funston, diretor sênior do programa de leões da Panthera, uma organização de proteção dedicada aos felinos selvagens, observa que também houve um grande pico nos assassinatos de leões na natureza durante os últimos anos. “Os caçadores cortaram a cabeça e os pés e deixaram o cadáver mutilado. Eles extraem os dentes e garras posteriormente. É muito mais raro que os caçadores processem o leão pelos ossos porque demora mais tempo”, esclareceu.

Funston sugere que algumas das mesmas pessoas envolvidas nos assassinatos de leões também podem caçar rinocerontes. Há ocasiões em que partes de leões são encontradas em carregamentos de chifres de rinoceronte traficados. Quando as autoridades moçambicanas descobriram 23 chifres de rinoceronte no aeroporto de Maputo em Março de 2016, por exemplo, elas encontraram 19 dentes e 57 garras de leões.

Em Maio deste ano, a prisão de traficante de chifres de rinoceronte no Vietnã também envolveu partes dos corpos de leões. Na África do Sul, sete suspeitos foram presos em Fevereiro deste ano por tráfico de chifres de rinoceronte, marfim de elefantes e garras e dentes de leões. Uma operação em Junho também descobriu diversos chifres de rinoceronte e ossos de leão.

O papel do comércio legalizado

Retrato de um leão
Segundo a ONG Panthera, um grande pico nas mortes de leões tem ocorrido nos últimos anos/ Foto: Animal Defenders International

Phillips acredita que a legalização do comércio internacional de ossos e de outras partes de leões criados em cativeiro tem contribuído para os assassinatos ao abastecer a demanda pelos animais. A decisão de manter um comércio legalizado de partes de leões mantidos em cativeiro foi estabelecida em 2016, na reunião de 182 países membros da Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas de Fauna e Flora Selvagens (CITES).

Uma proposta para interromper todo o comércio de leões foi rejeitada e foi proibido o comércio internacional de ossos, dentes e garras de leões selvagens e permitida a criação de leões em cativeiro.

No passado, diz Funston, do Panthera, os ambientalistas não pensavam que o comércio de partes de leões fosse uma ameaça grave. Eles acreditavam que a perda de habitat, a caça das presas dos animais, o conflito com os humanos devido à predação e a caça de “troféus” eram mais graves. Entre 2008 e 2011, a África do Sul exportou legalmente 1160 esqueletos de leões cativos (quase 11 toneladas) e, em Junho, anunciou uma cota de 800 esqueletos para este ano.

As vendas asiáticas dos ossos, dentes e garras dos animais têm crescido e Funston acredita que isso ocorre em parte porque a legalização do comércio impulsionou novos mercados. “No passado, existia vinho de osso de tigre. Agora você pode comprar vinho de osso de leão, é um produto completamente novo”, afirmou.

Colman O’Criodain, gerente de práticas políticas da vida selvagem do World Wildlife Fund, concorda. Ele disse ao The Guardian que, “como no comércio de partes de tigres criados em cativeiro, o comércio de ossos de leões criados em cativeiro mantém viva a demanda pelo osso do grande felino e dificulta os esforços de aplicação da lei”.

Proteger os 31 leões restantes salvos pela Animals Defenders International que vivem no santuário de Emoya é caro. Atualmente, a organização possui uma despesa mensal de US$ 7 mil com guardas armados, além de outras melhorias de segurança necessárias.

Para ajudar com os custos, o grupo, juntamente com o músico Moby, lançou o Fundo José e Liso Contra a Caça. O fundo, que visa arrecadar US$ 100 mil, apoiará os oficiais da polícia sul-africana que combatem a caça com suas investigações, ajudará na coleta e na análise de informações e na identificação de padrões de caça para que os assassinos de José e Liso sejam levados à justiça. Ele também será usado para investigar e coletar provas sobre outros assassinatos de leões e outros grandes felinos confinados e para saber mais sobre os crimes.

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