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Gatos de cemitério, amados e bem cuidados

16 de outubro de 2015
6 min. de leitura
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Por Fátima ChuEcco (da Redação)

Foto: Camila Gandolfi
Foto: Camila Gandolfi

Todo mundo sabe: onde tem cemitério tem gato. E isso é um cenário comum em diversos países. Alguns cemitérios, inclusive, ficaram famosos pela presença dos felinos, como é o caso do Recoleta, em Buenos Aires (Argentina) e o Père Lachaise, de Paris (França), onde desfilam gatos gordos e sossegados, acostumados a posar para fotos. O ambiente dos cemitérios é agradável para os bichanos já que passa a sensação de segurança (distante das ruas, cães e com circulação pequena de pessoas) e onde se pode tomar sol tranquilamente sobre os jazidos que também servem de abrigo.

Em muitos dos cemitérios, tanto no Brasil quanto no Exterior, protetores e simpatizantes dos felinos não apenas alimentam como também se encarregam de castrar e vacinar os bichanos, e promover doação de filhotes. Os gatos não causam doenças, não atacam as pessoas e ainda impedem a proliferação de ratos, além de que, enterram suas fezes evitando problemas com higiene. Mesmo assim, de tempos em tempos, surgem relatos de extermínios criminosos. Colônias inteiras no Brasil já foram devastadas por veneno ou mesmo a pauladas.

O método de CED – Captura, Esterilização e Devolução tem sido uma forma eficaz de manter sob controle as colônias de felinos em várias partes do mundo. É um método ético e assertivo porque quando se retira (ou extermina) abruptamente todos os gatos de um cemitério ocorre o chamado “efeito vácuo”, ou seja, rapidamente outra colônia se forma e o problema nunca acaba. Manter os gatos residentes no local saudáveis e castrados evita a invasão de mais gatos e, como na Argentina e na França, pode até atrair turistas.

Foto: Camila Gandolfi
Foto: Camila Gandolfi

Inspiração
Em Piracicaba, Interior de SP, a ONG “Gatos do Cemitério” já enfrentou problemas com extermínio de gatos com requintes de crueldade. Houve uma matança em 2012 e outra no ano passado quando 38 animais do Cemitério da Saudade foram mortos a chutes e pauladas, o que culminou com o afastamento de alguns funcionários e investigação da polícia. A protetora Elcian Granado criou o grupo em 2012 e também faz parte da Sociedade Piracicaba de Proteção aos Animais. O trabalho dos voluntários tem sido essencial e um belo exemplo de controle de colônias de gatos. No Cemitério da Saudade, onde o grupo atua, de 600 animais restam agora em torno de 250.

“Em 2008 vi o apelo de um casal que dizia não estar conseguindo sustentar os 600 animais do cemitério. Comecei a fazer campanhas para arrecadar ração. Na época eu já fazia castrações e promovia adoção de gatos da cidade e percebi que só alimentar os gatos do cemitério não resolvia o problema. Foi então que conheci o veterinário Antônio Sérgio Scanavaca. Eu levava oito gatos para castrar toda semana. Levava na segunda-feira e devolvia ao cemitério nas sextas. Depois conseguimos um abrigo para os que precisavam de internação que eram assistidos pela voluntária Elida Tomé. Os filhotes, quase sempre resgatados doentes e desnutridos, ficavam aos cuidados da veterinária Sandra Ortiz Ducatti. E assim o grupo foi crescendo contando hoje com vários colaboradores dedicados a esse trabalho”, conta Elcian.

Foto: Camila Gandolfi
Foto: Camila Gandolfi

Prefeitura e comunidade juntas
O empenho do grupo foi tão grande que, em 2014, conseguiu até um acordo com a prefeitura que se encarregou de doar ração, colocar câmeras no cemitério para evitar novos abandonos e também matanças, e criação de um abrigo. Uma vitória bastante inédita que mostra como a união do poder público com a comunidade pode render soluções realmente inspiradoras. “Ainda há abandono de ninhadas inteiras e gatos adultos porque, infelizmente, faz parte da nossa cultura essa postura irresponsável, mas com a parceira Drica Tabachi e outros colaboradores, continuamos cuidando, castrando e doando os animais num trabalho duro que requer, apesar da ajuda da prefeitura, a realização de rifas e campanhas de apadrinhamento para conseguir arcar com todas as despesas veterinárias e de manutenção”, explica Elcian.

Outra bela iniciativa que agregou valor ao trabalho realizado pela ONG “Gatos do Cemitério” foi o ensaio fotográfico de Camila Gandolfi (cujas fotos ilustram essa matéria). O objetivo da fotógrafa foi ajudar a ONG possibilitando as pessoas enxergarem os gatos de uma forma positiva, com imagens dignas de posters e quadros. O ensaio vem de encontro ao objetivo da ONG que é aproximar as pessoas dos gatos do Cemitério da Saudade que, segundo Elcian, ainda sofrem preconceito: “Tem gente que adota um filhotinho e quando fica sabendo que ele veio do cemitério nos devolve. Ainda bem que isso está mudando e temos conseguido muitas adoções responsáveis”. O ensaio completo da Camila pode ser visto no link e o trabalho do Gatos do Cemitério de Piracicaba pode ser conhecido no facebook.

Foto: Divulgação
Ricoleta. Foto: Divulgação

Gatos cuidam de túmulo em Buenos Aires
O Cemitério da Recoleta, em Buenos Aires (Argentina), é um ponto turístico bem conhecido e os visitantes apreciam, especialmente, o túmulo de Evita Peron (notória figura política do país), mas outro jazido atrai bastante a atenção dos turistas. É a cripta de Liliana Crociati de Szaszak e seu fiel cachorro Sabú. Em 1970, aos 26 anos de idade, Liliana morreu numa avalanche durante sua lua de mel na Áustria. Seu quarto foi atingido pelo desastre. Há relatos que no mesmo dia ou próximo da morte de Liliana, seu cachorro de nome Sabú também morreu a 14 mil km de distância. Os pais de Liliana construíram um mausoléu imitando o quarto da filha e na frente colocaram uma estátua de Liliana em tamanho natural com seu fiel companheiro.

Curiosamente, um gato se instalou exatamente na cripta de Liliana. Na época correram boatos que o gato seria a reencarnação do cachorro e o bichano começou a ganhar a simpatia dos visitantes atraindo turistas para o túmulo. Depois outros gatos simpatizaram com a cripta que hoje é frequentada por vários deles. Os turistas costumam esperar um deles aparecer para fazer fotos. Dizem também que acariciar a estátua de Sabú faz o visitante retornar a Buenos Aires.

Foto: Divulgação
Cemitério Père Lachaise. Foto: Divulgação

Cemitérios franceses reúnem celebridades e muitos gatos
No famoso Père Lachaise, além de outros cemitérios franceses como o Montparnasse e Montmartre, igualmente escolhidos pelos turistas para passeios, estão enterrados artistas, famílias nobres, soldados homenageados e vítimas de grandes tragédias. E os gatos, geralmente grandes e gordos, estão por toda parte. Entidades francesas de proteção animal atuam nesses locais com trabalhos de castração e cuidados básicos aos felinos. No Père Lachaise, em Paris, os gatos descansam sobre sepulturas de personalidades como Auguste Comte, Fredéric Chopin, Marcel Proust, Jean de La Fontaine, Georges Bizet, Oscar Wilde (em apreciador de gatos), Moliére, Edith Piaf, Alfred de Musset, Maria Callas, Yves Montand, Gioachinno Rossini, Honoré de Balzac, Eugéne Delacroix, Isadora Duncan e Allan Kardec, isso sem falar de alguns astros do rock como Jim Morrison, da banda The Doors. Acompanhe em breve a segunda parte dessa reportagem sobre gatos de cemitério, com outras iniciativas inspiradoras.
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