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100 mil cães e gatos são mortos por ano pelo poder público em Portugal

9 de julho de 2015
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Foto: José Sérgio/SOL
Foto: José Sérgio/SOL

Ao fim de oito dias num canil, qualquer animal de companhia pode ser morto. É precisamente o que acontece todos os anos a cerca de 100 mil cães e gatos recolhidos pelos organismos públicos, segundo estimativas do PAN – Pessoas-Animais-Natureza.
“Esta conta é feita por baixo”, esclarece Pedro Fonseca, que coordena o Grupo de Trabalho e Acção para o Fim dos Canis de Abate, do PAN, baseando-se num requerimento sobre o tema feito pelo CDS às câmaras municipais, em 2011. Significa isto que serão mortos diariamente cerca de 300 cães e gatos.
“Há canis que têm taxas de abate de mais de 90%”, alerta Pedro Fonseca que luta pelo fim “desta crueldade em Portugal”.
O tempo previsto para o canil matar os animais à sua guarda é precisamente uma das questões que o PAN quer ver alteradas na lei. Porque, nesse prazo, é difícil que o animal tenha hipóteses de ser resgatado: “Até aos oito dias, um cão não pode ser adoptado, uma vez que é o período em que o dono pode reclamá-lo. Após esse período, um animal sem qualquer problema de saúde pode ser abatido”, lamenta.
O problema ganha ainda maior dimensão no Verão, em que aumentam os abandonos. Também no fim da época de caça é habitual que cresça o número de cães que são abandonados pelos tutores e chegam aos canis, muitas vezes já sobrelotados: “Por vezes, têm cortes na pele, porque os donos retiraram-lhes o chip”, conta Pedro Fonseca.
Para o PAN, o problema só pode ser resolvido com um conjunto de soluções. Por um lado, reduzindo o excesso de cães e gatos através da esterilização de todos os animais à guarda do Estado e promovendo a sua adopção. E, por outro lado, transformando os canis em espaços seguros onde possam ser mantidos e tratados, assegurando que os membros das uniões zoófilas ali possam aceder e dar apoio. “É mão-de-obra voluntária e altamente motivada”, sublinha o responsável.
Pedro Fonseca diz que a fiscalização do registro dos animais, também é fundamental para reduzir o número de animais mortos, já que permite a identificação dos tutores em caso de abandono.
Parlamento discute medidas
A aplicação deste conjunto de medidas, defende o PAN, teria além disso outra importante vantagem: os estudos revelam que, a médio e longo prazo, a esterilização e a promoção da adopção dos animais ficam mais baratas do que a morte, que implica custos de transporte e de incineração dos cadáveres.
O tema passou a integrar a agenda mediática no início do ano, através da Iniciativa Legislativa de Cidadãos (ILC) do PAN, que conseguiu reunir 43 mil assinaturas reconhecidas em apenas dois meses e meio.
A pressão da sociedade, como admitem os deputados, levou novamente o assunto à Assembleia da República (AR). Na semana passada, e quando a legislatura está na recta final (termina dia 23), foi discutido o projecto de lei do PCP para um novo regime jurídico da modernização de Centros de Recolha Oficial de Animais e dos serviços municipais de veterinária, que prevê a proibição da morte induzida nos canis e medidas de controlo da população de animais errantes. “É uma questão de mudança de paradigma: do abate para a esterilização”, sintetiza o deputado socialista Pedro Delgado Alves.
As propostas dos comunistas e também do BE, que apontam no mesmo sentido, reuniram o consenso de todos os partidos na questão fundamental – o fim dos canis de morte induzida -, mas não foram votadas como estava previsto. Por unanimidade, os partidos decidiram que os projectos baixassem à Comissão da Agricultura e do Mar, para serem trabalhados tecnicamente.
O objectivo, explica Cristóvão Norte, do PSD, é “encontrar soluções exequíveis” para o problema, de “indiscutível interesse público”. Uma das questões “nevrálgicas” a resolver é o tempo que a nova legislação dará às autarquias para se adaptarem: “Não pode ser feito de um dia para o outro, é necessário haver condições”.
Mas não só: outra questão é o financiamento do Estado às autarquias para que possam investir em infra-estruturas e meios humanos. “Também será necessário robustecer as competências da Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV)”, sublinha o deputado do PSD, que não arrisca prazos para a aprovação da nova lei: “É necessário ter em conta os vários intervenientes a ouvir, como as associações de municípios, a Ordem dos Médicos Veterinários e as associações de defesa de animais. Se for possível fazê-lo em tão pouco tempo e criar uma lei séria e sustentada, óptimo. Mas não podemos legislar por legislar”.
Para o PCP, esta é uma questão de vontade. “O Governo pode pedir pareceres aos intervenientes”, explica um dos autores do projecto de lei, Miguel Tiago, adiantando que o seu partido está disponível para abdicar de uma das suas reivindicações que não reúne o apoio da maioria: a gratuitidade da vacinação e da esterilização para todos. No que se refere ao tempo dado aos municípios, o PCP também tem uma proposta: “A proibição do abate pode acontecer município a município, à medida que modernizem os seus canis”.
Proibir a morte induzida é ‘medida solta’
Num ponto, ninguém tem dúvidas: a morte não funciona como política de controlo das populações de animais. Mas esta questão, avisa a bastonária dos Veterinários, Laurentina Pedroso, tem de ir “além das guerras partidárias”, pois “a simples proibição do abate é uma medida solta”. “Há questões de fundo a resolver antes, como a existência de infra-estruturas para albergar os animais e a dotação financeira às autarquias para que executem a lei. São necessários mais recursos humanos, condições físicas e políticas que promovam a adopção, e meios técnicos para vacinar e esterilizar os animais”, sublinha a bastonária.
‘Metade dos canis estão ilegais’
São 124 os municípios que possuem centros de recolha autorizados pela Direcção-Geral da Alimentação e Veterinária, avança fonte oficial deste organismo. Mas “como podemos proibir as câmaras de abater os animais, se 50% dos canis não estão sequer licenciados?” – questiona a bastonária da Ordem dos Médicos Veterinários, Laurentina Pedroso.
“Ninguém pode estar contra uma medida que proíba o abate de animais errantes, mas é necessário que a lei tenha consequência”, salienta a responsável. E dá como exemplo o caso da Madeira, onde a Assembleia Legislativa Regional proibiu, na semana passada, a morte de animais de companhia: “Nem sequer têm um veterinário municipal. Como poderão fazer esterilizações e vacinações?”
*Esta notícia foi escrita, originalmente, em português europeu e foi mantida em seus padrões linguísticos e ortográficos, em respeito a nossos leitores.
Fonte: Sol
 

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