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Zoológico de Buenos Aires não terá mais animais exóticos

10 de maio de 2015
6 min. de leitura
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Por Loren Claire Boppré Canales (da Redação)

Foto: Reprodução/Parabuenosaires
Na foto, a orangotango Sandra: o primeiro grande símio do mundo a ser considerado judicialmente como “sujeito não-humano” (Foto: Reprodução/Parabuenosaires)

Partindo de uma compreensão profunda de que a vida em cativeiro implica na violação dos direitos animais, os zoológicos do mundo parecem caminhar – ainda que bem lentamente – para uma transformação completa.
O Zoológico de Buenos Aires, por exemplo, já não será mais o mesmo. A médio prazo, a já famosa orangotango Sandra, a quem a justiça outorgou um habeas corpus, e a elefanta Mara, que durante anos viveu no Circo Rodas, serão transferidas a centros de preservação de acordo com as latitudes que originalmente teriam habitado. As informações são do La Nacion.
Estas duas medidas fazem parte da proposta iniciada no zoológico para transformar-se, supostamente, em um centro de conservação, pesquisa e educação. Já não receberão mais animais exóticos e toda sua coleção, com aproximadamente 2000 espécies, será avaliada para que outros animais também possam ser transferidos.
Essas mudanças serão anunciadas pela Comissão Técnica Ambiental, para a transformação do Jardim Zoológico Eduardo Ladislao Holmberg, com o propósito de ser considerado “um símbolo de cidade verde e um novo centro de conservação da biodiversidade e de educação ambiental”.
Discurso ambíguo
“A ideia é transformar verdadeiramente o zoológico. Ele será um promotor ativo da conservação no país e vai impor a ideia de que ali já não é um lugar de aprisionamento”, declarou Juan Carlos Villalonga, presidente da Agência de Proteção Ambiental de Buenos Aires (APRA) e integrante da comissão reformadora.
Villalonga parece também preocupado, no entanto, em deixar o lugar mais atrativo às visitações: “O grande sacrifício é conseguir que o espaço continue sendo atrativo. Hoje, 3,5 milhões de pessoas visitam o lugar por ano. É um centro de atração muito grande e o que se busca é que haja uma conexão com os espaços verdes que o rodeiam”.
Dentro do plano de reforma foi incluído também um fundo anual de 1,3 milhões de pesos para projetos de conservação da fauna dentro ou fora do zoológico, incluindo outros pontos do país – acreditemos.
O zoológico de Buenos Aires é controlado hoje por uma concessão liderada pela empresa Jardim Zoológica, muito questionada. Paga mensalmente um valor de 1,5 milhões de pesos. Segundo a prefeitura, o fundo para os projetos de conservação sairá desse valor.
O contrato dessa companhia termina em 2017, mas ainda é uma incógnita quem estará à frente da próxima administração. “As mudanças nos zoológicos do mundo foram graduais e está sendo analisado se é melhor ser administrado por uma fundação, a exemplo do que acontece no Zoológico de Nova Iorque, disse o titular da APRA.
Ativistas defendem a transformação do zoo em centro de reabilitação
Malala Fontan, ativista pelos direitos animais, conhece o projeto, e ainda que apoie a iniciativa, acredita que falta definir um plano mais concreto: “Têm aparentemente muitas boas intenções, mas que nunca foram bem delineadas. Não têm um projeto de reconversão, não definiram se é público ou privado; muito menos se haverá exibição de animais em cativeiro”.
Fontan, junto a outros ativistas, apresentou na Assembleia Legislativa um projeto para transformar definitivamente o zoológico. Propõe o realojamento de animais e que aqueles que não possam ser retirados, não sejam exibidos ao público. “Não queremos que as mais de 400 pessoas que trabalham no zoológico percam seu emprego. Queremos que o zoo seja transformado em um centro de recuperação para a fauna que é apreendida”, assinalou.
Foto: Maxi Failla
Na foto, Sandra em sua vida de cativeiro no zoo (Foto: Maxi Failla)

Andrés Gil Domínguez é o representante legal da orangotango Sandra e avalia com um grupo de especialistas primatólogos quais as melhores opções para fazer o realojamento do símio. “Há uma situação que não pode ser mantida, que é a do zoológico, porque é a pior situação para Sandra, entendendo que o cativeiro implica a violação dos seus direitos”.
Mas o translado dos animais não é simples. Avaliando caso a caso, Sandra poderia habitar um santuário na Flórida, Estados Unidos, mas teria que se submeter a um tratamento de quimioterapia exigido pelas autoridades sanitárias estadunidenses e que poderia colocar sua vida em risco. A elefanta Mara seria recebida sem problemas no Cambodia Wildlife Sanctuary. No Camboja não há exigências sanitárias, mas para que isso se concretize, é necessário que seu proprietário, o Circo Rodas, a ceda à cidade.
Claudio Bertonati é biólogo e especialista em preservação. Esteve durante um curto período de tempo no zoológico de Buenos Aires e renunciou depois de várias irregularidades por ele denunciadas. “Comemoro o fato de terem iniciativa para transformá-lo. Não há outra opção: ou transformam ou fecham”.
No entanto, foi cauteloso ao avaliar o programa de reconversão: “Para transformar o zoológico em um grande centro de educação ambiental, temos que alinhar muitos esforços e o panorama é muito complexo. Os cidadãos valiosos e comprometidos com esses objetivos não estão muito dispostos a se expor diante da atual situação”, disse.
“Quem assumir o zoológico herdará uma situação de decadência muito profunda desde todos os pontos de vista: conceitual, transparência do que deve ser feito; herdará empregados que não estão em condições de acompanhar este processo; há pessoas valiosas, mas fazem parte de uma minoria”, acrescentou.
Representantes da APRA demonstraram ainda que há uma real intenção de gerar mudanças. Inclusive supõem que futuramente poderiam unir fisicamente o Zoológico e o Jardim Botânico.
Nota da Redação: Entendemos que algumas mudanças possam se dar a passos lentos, no entanto é preciso cuidar de não criar para si um novo jeito de estagnar-se no mesmo problema. Partimos também da premissa de que, se há o desejo pela solução, a solução existe. Os zoológicos enquanto cativeiros e fonte de lucro e entretenimento devem ter sua natureza transformada completamente: ou passam a existir como centros de reabilitação de animais selvagens, onde estes recebem cuidados antes de serem reintroduzidos ao meio natural; ou se convertem em santuários, onde viverão – em condições naturais porém protegidas – os animais que não mais poderão viver autonomamente na natureza; ou então simplesmente deixam de existir. Nenhum ser vivo existe para ficar enjaulado e ser exibido aos olhos humanos. Não queremos novas caras para o mesmo sistema de escravização de vidas. Queremos a verdadeira transformação: ou muda completamente ou deixa de existir. Enquanto isso não for feito, seguiremos colhendo para nós os efeitos.

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