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Sangue de caranguejos é roubado para pesquisas médicas

7 de outubro de 2014
5 min. de leitura
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(da Redação)

Foto: PBS
Foto: PBS

Ao longo da história, pesquisadores têm inventado as mais diversas maneiras de exploração de animais alegando o “bem da ciência”. Uma invenção recente consiste na coleta de sangue de caranguejos. As informações são do One Green Planet.

Milhares de caranguejos-ferradura – estima-se aproximadamente 500 mil – são recolhidos pela indústria médica todos os anos para terem o seu sangue drenado enquanto ainda estão plenamente vivos e conscientes, em um procedimento que parece mais ter saído de um filme de terror.

Isso é feito pois o sangue desses artrópodes não contém hemoglobina – que é a responsável pelo transporte de oxigênio dentro das células vermelhas do sangue de vertebrados. Para esse transporte, os caranguejos-ferradura usam a hemocianina e, portanto, o seu sangue original tem uma bela cor azul.

Na década de 1960, o Dr. Frederik Bang, pesquisador da Universidade John Hopkins, observou que a coagulação massiva ocorria quando bactérias marinhas comuns eram injetados na corrente sanguínea do caranguejo-ferradura norte-americano. Por causa da história evolutiva impressionante da espécie e alterações relativamente sutis na aparência e na fisiologia, os caranguejos-ferradura têm um composto no sangue chamado Limulus Amebocyte Lysate (LAL) para atacar rapidamente as infecções, como um sistema imunológico. O “LAL” coagula em torno dos considerados “maus” germes, tais como endotoxinas bacterianas, vírus e fungos. Em outras palavras, o sangue torna-se uma substância gelatinosa. Devido a esta descoberta, o “LAL” passou a ser usado para proveito da área médica, uma vez que poderia atuar como um teste de triagem de padrão internacional para contaminação bacteriana e por toxinas em aplicações biomédicas.

Pela lei, os medicamentos certificados pelo US Food and Drug Administration, que é o órgão regulador de fármacos dos EUA, devem ser testados para a segurança humana, utilizando-se para isso o sangue azul leitoso de um caranguejo-ferradura.

Segundo a reportagem, o sangue desses animais tem protegido os seres humanos de serem expostos a bactérias gram-negativas letais. Um litro de sangue azul está avaliado em aproximadamente 10.000 e 15.000 dólares. Claramente, a captura de caranguejos-ferradura para uso na medicina tornou-se uma indústria lucrativa global e, infelizmente para esses artrópodes, os pesquisadores também encontraram evidências de que outras substâncias nos organismos dos caranguejos-ferradura podem ter propriedades antibióticas, antivirais e anti-cancerígenas.

Tal prática está em total desacordo com os direitos animais pois, ao contrário dos sistemas de banco de sangue humanos, os caranguejos-ferradura não optam por doar “de bom grado” os fluidos preciosos do seu corpo – e, além de ser um processo involuntário, trata-se de uma grande quantidade: cada animal tem 30% do sangue de seu corpo extraído. Embora, de acordo com a reportagem, os animais sejam liberados de volta ao seu habitat selvagem após ter o sangue subtraído de seus corações através de agulhas, o caranguejo-ferradura leva cerca de 30 dias para recuperar o sangue após o lançamento.

Além disso, uma pesquisa recente revelou evidências de mudanças significativas no comportamento de caranguejos-ferradura, depois de “sangrados”. De 20 a 30% não sobrevivem às extrações de sangue, e os sobreviventes podem sofrer efeitos negativos. Os caranguejos-ferradura “coletados” quando encalham para se reproduzir; uma vez que eles não podem mais se reproduzir sem temer os seres humanos, o sucesso da sua reprodução pode ser afetado. Enquanto seres aquáticos, a sua manipulação fora da água também é muito estressante, o que aumenta as taxas de mortalidade.

A captura de caranguejos-ferradura levou à ganância por parte das indústrias médica e farmacêutica mas, enquanto o ato de recolher e liberar esses animais foi considerado “seguro e sustentável” no passado, esse já não é mais o caso. Juntamente com pressões pesadas como as alterações climáticas, a destruição do habitat e a pesca predatória, a demanda pelo sangue do caranguejo-ferradura está causando significativo declínio em suas populações. Estudos na baía de Delaware relataram uma redução de aproximadamente 75% da sua população de caranguejos-ferradura.

Como se não bastasse, muitas aves marinhas migratórias e outros animais se alimentam de seus ovos, tornando os caranguejos-ferradura uma espécie importante para a cadeia alimentar marinha e para os ecossistemas. Embora as populações desses animais ainda não sejam consideradas “em perigo” de extinção, já existem correlações entre o declínio das populações de aves com o aumento da demanda pelos caranguejos-ferradura.

Caranguejos-ferradura habitam o planeta há mais de 450 milhões de anos, e sobreviveram a três das maiores extinções em massa da Terra, o que os coloca como uma das espécies animais historicamente mais bem sucedidas do mundo – mas que agora corre o risco de não sobreviver a uma das maiores ameaças atuais do planeta: os seres humanos.

Qual é a solução?

Caranguejos-ferradura foram até hoje considerados críticos para a proteção da saúde humana e para a indústria biomédica. Conforme a reportagem, sem o uso de seu sangue, a medicina não teria sido capaz de testar as bactérias gram-negativas responsáveis ​​pela meningite, febre tifóide e outras doenças que ameaçam a vida humana, e ainda não há alternativa sintética eficaz que possa ser posta em prática.

Embora os seres humanos estejam se beneficiando do uso desses organismos, os ecossistemas não estão, e os caranguejos-ferradura certamente não gostam de ser usados, tornando a questão em uma grande controvérsia ética.

No entanto, há uma boa notícia. Algumas instituições estão trabalhando para encontrar um substituto viável para o sangue azul. Por exemplo, pesquisadores do Departamento de Engenharia Química e Biológica acreditam que podem ter descoberto uma substância que reage de forma semelhante a endotoxinas como o “LAL” mas, por enquanto, as pesquisas ainda estão em curso, e os caranguejos continuam sendo explorados e mortos em nome da Ciência.

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