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Morrer de cansaço

25 de junho de 2013
4 min. de leitura
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Tem uma foto minha, aos 3 ou 4 anos de idade, montada em um jumentinho todo paramentado. Eu me lembro do dia desta foto. Eu me lembro de ter sentido muita emoção por estar tão perto do “cavalinho” (para mim, aquele era um belo cavalo!) e de ter soltado um grito quando ele deu uns passos comigo em cima da sela.

Eu também me lembro de ter afagado o bichinho no pescoço… E me lembro de que essa foto foi minha favorita durante muitos, muitos anos.

Sempre amei os animais. Para mim, naquele momento, montar no “cavalinho” era um gesto de amor. Eu não imaginava que o estava escravizando.

O mesmo deve acontecer com muita gente que usa as charretes de Petrópolis, da Ilha de Paquetá, de Campos do Jordão e de tantos outros destinos turísticos que mantêm os “charmosos” (para quem?) passeios a bordo de veículos puxados por animais. Não creio que o turista médio, que vai passear nessas localidades na companhia de seus familiares durante um final de semana prolongado, aja de má-fé. É, talvez, um inocente útil, a alimentar uma atividade cruel, que já deveria ter sido extinta há muito tempo.

A questão das charretes ganhou recente notoriedade com o desfalecimento, em praça pública, do cavalo Falcão. Exausto, ele caiu diante de todos. Foi examinado e os veterinários constataram desidratação, entre outros sinais de maus-tratos.

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Foto: Divulgação

E a reação do Sr. Rubens Bomtempo, Prefeito de Petrópolis, cidade onde se deu o fato, limitou-se à promessa de que os cavalos serão “examinados”.

Não basta isso, Sr. Bomtempo. Em 2004, um cavalo já havia caído morto de tanto cansaço, diante de todos! Falcão não é a primeira, nem será a última vítima. Será que falta, ao Prefeito, a coragem necessária para encaminhar um Projeto de Lei à Câmara Municipal, sugerindo o fim da atividade? Neste caso, um empurrãozinho dado pela opinião pública seria extremamente útil.

Também merece menção a morte recente do cavalo Parceiro, socorrido em estado grave na Ilha de Paquetá por veterinários da Secretaria Especial de Defesa dos Animais, em 26 de março deste ano. Os técnicos atenderam denúncias de moradores da região, e o animal foi transferido para o Centro de Controle de Zoonoses local. Anêmico e desidratado, Parceiro trazia em seu corpo combalido diversos sinais de tortura e uma lesão na medula que o impedia de ficar em pé. Infelizmente, as providências foram tardias: após o resgate, Parceiro viveu só mais cinco dias.

O mais triste é que a tragédia não teria acontecido se as leis do País não fossem tão frouxas. Afinal, o “dono” de Parceiro, um tal de Edir Rosa, já havia sido denunciado em outras ocasiões, sem que nada de efetivo acontecesse. Somente após a repercussão do fato mais recente ele perdeu a licença de trabalho – mas as autoridades locais não foram além desses passos tímidos.

Cavalos são animais inteligentes e sensíveis. Têm uma história longeva e sólida de cooperação com a humanidade, que os recompensa com o matadouro depois de uma vida inteira de trabalho, com a eutanásia diante de uma pata machucada, com a exploração de sua força e beleza até que seu coração sucumba numa tarde de calor…
Se estamos sempre prontos a rechaçar os absurdos da China, as touradas de Espanha, as rinhas ilegais e a farra do boi, não podemos fazer vista grossa ao abuso cometido pelos “comerciantes de passeios” em charretes que atuam Brasil afora.

O primeiro passo talvez seja conscientizar os potenciais usuários. Em minha humilde opinião, quem odeia animais costuma ficar longe deles. Por isso, acredito mais na predominância dos “clientes tolinhos” do que no fluxo em massa de pessoas malvadas querendo maltratar os bichos. Tenho certeza de que falta, para essa gente, informação bastante para repensar (e readequar) seus hábitos.

E nada acontece fora da política. Por isso, é urgente pressionar os homens públicos dessas localidades, para que realizem mudanças significativas em suas legislações. Certamente, o argumento do “impacto econômico” surgirá para defender que tudo permaneça como está, mas aqueles que hoje exploram essa atividade podem muito bem migrar para outras áreas. O Brasil carece de trabalhadores para a construção civil, por exemplo. Esses indivíduos bem que podem aprender uma profissão de verdade e gerar dividendos para o País, em vez de arrancarem o sustento da dor e da exaustão de animais inocentes.

Voltarei ao assunto brevemente.

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