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Conheça a história das rinhas de pit bulls

18 de março de 2012
20 min. de leitura
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Por Robson Fernando de Souza (da Redação)

Foto: s/c

Embora cada vez mais repudiadas pela sociedade e já tipificadas como crime no Brasil pela Lei de Crimes Ambientais, a rinha de cães ainda persiste em alguns quinhões do país e do mundo, sendo uma notória forma de pessoas se divertirem por meio de violência gratuita entre inocentes. Numa escravidão ainda mais nítida do que a imposta aos antigos gladiadores romanos, aproveita-se o açulado instinto violento de cães já incitados à agressividade para explorá-los nessas rinhas, de onde saem muito feridos ou mesmo mortos.

Os pit-bulls, especificamente, são hoje o símbolo maior – e as vítimas mais notáveis – dessa exploração violenta com fins de entrenimento. Sua forçação ao atributo involuntário de lutadores tem raizes na Antiguidade, quando seus ancestrais molossos eram usados em guerras e também nas primeiras rinhas, conforme o texto abaixo, extraído do site IssoÉBizarro.

A origem dos cães de combate: Brigas de cães Pit-bull

A história do desenvolvimento do American Pit Bull Terrier na máquina de combate que é hoje tem início há cerca de dois séculos. Era o período do apogeu do Bull Dog e a atividade predominante não era a luta de cães, mas sim o “bull baiting”.

Tomando o termo cães de combate num sentido mais amplo – cães de guerra, de caça pesada e perigosa e lutas contra os mais diversos oponentes – vamos recuar no tempo e tentar reconstituir a história deste grupo.

Esta tentativa não é uma empreitada simples. A documentação é esparsa e muitas vezes dispomos de apenas fragmentos de um mural para fundamentar uma linha de raciocínio.

Este breve histórico está baseado na obra de dois renomados estudiosos do tema: os Drs. Carl Semencic e Dieter Fleig. Os autores Diane Jessup e Richard Stratton foram também exaustivamente consultados.

2000 AC: Os babilônios já usavam cães gigantescos em seus exércitos.
1600 DC: 
os cães utilizados para caça pesada, como o aurochs e o stag, eram descendentes dos grandes molossos.
1800:
 O bear baiting, a luta entre um urso e um Bull Dog, deixou de ser prerrogativa da nobreza e tornou-se uma diversão popular. Pequenas fortunas surgiam em função das apostas e com a manutenção dos ursos. O Bull Dog já era praticamente idêntico ao moderno Pit Bull.
1830:
 O bull baiting era o entretenimento favorito das massas. O Bull Dog é claramente um Pit Bull moderno, de compleição mais robusta.
1850:
 Com a proibição do bull baiting, as lutas de cães se tornam populares. O Bull and Terrier, menor e mais ágil, substitui o Bull Dog: está formado o Pit Bull.

Onde tudo começou: os molossos

Desde que a criação de cães se tornou sistemática, a transformação dos cães em especialistas numa determinada tarefa sempre foi uma meta a ser atingida. A seleção de cães até meados do século passado sempre teve como propósito o emprego do cão: pastores, guardas, caçadores dos mais diversos tipos, farejadores e o nosso grupo alvo: os cães de combate.Sua origem é incerta, composta de fragmentos que dão margem a muita imaginação na montagem deste quebra-cabeças.

Alguns teóricos apontam esta origem para o Tibete e Nepal, como descendentes diretos do lobo preto tibetano. Esta teoria é baseada em literatura chinesa de 1121 A.C., bem como em cerâmicas, murais etc e prega que esses cães são a base de todos os molossos, expandindo-se gradualmente para outras regiões.

Outros pregam que regiões menos desenvolvidas culturalmente possam também ter desenvolvido raças similares, porém não houve registro. Migrações, rotas comerciais, campanhas militares etc teriam então difundido tais cães. Tal teoria é suportada por escavações que encontraram crânios de lobos de proporções similares aos dos atuais molossos por todo o Velho Mundo.

Seja qual for sua origem, registros de sua atuação nos campos de batalha não faltam:

– Hamurabi, rei da Babilônia, já empregava cães gigantescos com seus guerreiros em 2100 A.C.

– Os Lídios, tribo asiática, utilizaram um batalhão de cães em suas guerras contra os Kimérios (628 – 571 A.C.)

– Os persas do Rei Kambyses também os utilizaram contra os egípcios em 525 A.C.

– Na batalha de Maratona, um cão de guerra ateniense foi imortalizado como herói em um mural.

A partir de cerca do ano 100 D.C., os romanos passaram a adotar uma companhia de cães por legião. Anos antes, durante a invasão da Inglaterra, os mastiffs ingleses se mostraram muito superiores aos cães romanos, sendo trazidos para Roma e utilizados em lutas no Coliseu.

Em tempos mais recentes, os espanhóis os utilizaram no México para dizimar os povos locais; o Conde de Essex, no reinado de Elizabeth I, também lançou mão deles para sufocar, de forma sangrenta, um levante irlandês; Napoleão determinou que fossem utilizados na batalha de Aboukir.

Nas guerras deste século, os cães também foram largamente utilizados, porém não mais diretamente no combate e sim como mensageiros, guardas, detetores de minas etc. O emprego dos grandes molossos tinha acabado.

Encerrou-se, então, uma era em que a coragem e a devoção do cão a seu master foi testada como nunca. E foi comprovada na mais cruel das situações, onde coragem e bravura são requisitos para a sobrevivência: os campos de batalha.

A caça de grandes e perigosos animais:

Esta modalidade de caça concentrava-se basicamente em cinco animais: aurochs, stag, bisão, javali e urso. Teve sua origem na Idade Média e durou até fins do século passado.

Os três primeiros eram espécies de gado selvagem. Alguns chegavam a atingir 1,80m na cernelha e pesar 700kg, sendo animais incrivelmente ágeis para o seu tamanho. Os javalis chegavam a mais de 1m de altura e possuíam presas poderosas. Os ursos atingiam 1,25m e os maiores exemplares chegavam a 350kg.

A caça desses amimais sempre foi um desafio para o homem. Tais caçadas eram tão prestigiadas que eram, por lei, reservadas a reis, nobreza e grandes proprietários de terras. Como muitos cães perdiam a vida nessas caçadas, camponeses e servos eram obrigados a criar e ceder esses cães para a nobreza.

Fartamente ilustradas, as pinturas de caçadas retratam cães bastante similares aos atuais mastiffs e greyhounds. Porém, gravuras de meados do século passado retratando caçadas de javalis na América mostram claramente o emprego de pit bulls de maior estrutura. Relatos de caçadas de ursos, búfalos e elefantes utilizando bull-and-terriers de 20kg podem ser encontrados no livro de George P. Sanderson Thirteen Years Among the Wild Beasts of India, de 1870.

Este tipo de caçadas, diferentemente do que ocorre com o que imaginamos como caçadas com cães (com pointers, retrievers, spaniels), exige animais com determinação, coragem e tolerância a dor excepcionais, características só encontradas nos cães de combate.

Os cães de luta contra animais selvagens

Além do bullbaiting, que era uma atividade relativamente recente, os tenazes mastins sempre foram utilizados em combates contra os mais diversos oponentes. Os mais comuns foram leões e ursos, mas texugos e até macacos foram utilizados neste insólito tipo de rinhas.

Registros desses tipos de combate são quase tão antigos quanto seu emprego em guerras. Na verdade, parece intimamente ligado às guerras. Na mitologia grega, vemos no escudo de Aquiles a representação da vitória de seu cão sobre dois leões. O rei persa Kambyses, o mesmo que já utilizava cães em seu exército e reinou de 529 a 522 A.C., possuía um cão que iniciou um combate contra dois leões adultos. Alexandre, O Grande, rei da Macedônia de 356 a 323 A.C., foi apresentado na Índia a cães que combatiam com sucesso contra leões e mantinham a presa enquanto eram mutilados. A tenacidade dos cães era tal que o rabo, as patas e finalmente a cabeça eram sucessivamente decepados a espada sem que o cão largasse o leão. Estes são os principais relatos da antigüidade do eterno sonho de possuir um cão invencível e leal, capaz mesmo de derrotar a maior das bestas – o leão. Obviamente, fábulas e exageros foram incorporados a muitos relatos.

Passando para a Inglaterra medieval, o centro europeu de lutas de animais da época, encontramos as lutas como um dos principais entretenimentos da corte, intimamente ligado às caçadas. Aqui, a principal presa era o urso, sendo o primeiro registro histórico baseado em documentos do bear baiting datado do ano de 1050. Leões também eram ocasionalmente utilizados, pois eram um presente muito apreciado pelas cortes européias. Há um relato de que o Rei James I patrocinou uma luta entre um leão e três mastiffs no final do século XVI, dos quais um sobreviveu.

Tanto a Rainha Elizabeth quanto seu sucessor James I eram grandes adeptos dos blood sports. A rainha criava seus próprios mastins e o segundo instituiu o cargo de Master of the Game Beares, Bulles and Dogges. Eram encargos do Master todas as lutas de animais da corte, bem como a aquisição, criação e reprodução dos animais, recebendo um provento anual de 450 libras, uma verdadeira fortuna para a época. A pedido do rei, vinte fêmeas de mastiff eram mantidas na Torre de Londres como base da criação real de bear dogs.

O bear baiting logo passou a ter regras escritas e um grande número de arenas surgiu em Londres. A mais antiga de todas foi, provavelmente, o Old Bear Garden, cuja primeira referência é de 1574. Era situado bem no centro de Londres e ainda existe hoje como Bear Garden Museum.

Após a subida ao poder de Oliver Cromwell (1599 – 1658), os Puritanos baniram as brigas de animais. Mais tarde, após a Restauração, os combates ressurgiram com maior popularidade ainda, encontrando mais e mais adeptos, principalmente entre as massas.

A popularidade dessas lutas só pode ser entendida como fruto da paixão dos ingleses por apostas e jogos de azar. Os espectadores apostavam se um determinado cão conseguiria pegar o urso pelo pescoço, quanto tempo manteria a presa etc. Existiam planilhas de apostas, onde eram contabilizadas tanto as performances anteriores do urso quanto as do cão. Os ursos eram criados profissionalmente no Bear Garden e os donos dos cães pagavam para lançar seus cães contra eles. Somadas aos ingressos, eram uma considerável fonte de renda, que poderiam gerar pequenas fortunas.

Ao que tudo indica, estes tipos de lutas praticamente desapareceram por volta de 1825, quando as lutas contra touros eram a atração principal.

O Bull Baiting

Bullbaiting era um “esporte” que consistia em atiçar os bulldogs contra um touro amarrado pelo pescoço para que estes pudessem derrubá-lo mordendo-o pelo nariz.

Evidências da popularidade do bullbaiting séculos atrás ainda podem ser vistas em várias cidades da Inglaterra.  Em certas cidades, como Birmingham e Dorchester, os nomes de algumas ruas se referem à proximidade da arena. Em outras cidades, arenas de touros estão preservadas.

Esta atividade, embora nos pareça repulsiva, era outrora bastante apreciada. Senão, vejamos:

– O primeiro registro de bullbaiting é de 1209. O Lord de Stamford, fascinado pela cena de um cão subjugando um touro no pátio de seu castelo, determinou que, a partir de então, seis semanas antes do dia de natal, um touro deveria servir de presa para os cães para que o “esporte” continuasse para todo o sempre.

– Em 25 de maio de 1559, embaixadores franceses foram recebidos pela Rainha Elizabeth com um jantar seguido de lutas de cães com touros e ursos. Gostaram tanto que repetiram a dose no dia seguinte.

– Cerca de 25 anos depois, a mesma Rainha Elizabeth recebeu o embaixador dinamarquês com cerimonial idêntico.

– O Rei James I continuou a tradição da Rainha Elizabeth, recebendo a corte espanhola no início do século XVII com uma programação especial de baiting que incluía touros, cavalos e ursos. O encerramento foi com um urso branco lançado ao Tâmisa, para que os cães o atacassem nadando.

– O Rei Charles I, filho do Rei James I, também foi um ávido adepto dos blood sports. No reinado da Rainha Ana (1665-1714), tais espetáculos continuaram a ganhar popularidade.

O bullbaiting era uma atividade tão entranhada no dia a dia que alguns distritos possuíam leis proibindo a venda de carne de boi que não houvesse passado pelo baiting. Acreditava-se que assim a carne ficava mais macia e nutritiva!

À vista das touradas, que ainda hoje mobilizam multidões, a prática de deixar um cão derrubar um touro pelo nariz pode não parecer tão cruel assim. Só que o “esporte” não consistia apenas em deixar um cão derrubar o touro antes deste ser abatido. Havia requintes de crueldade como os descritos a seguir:

– Quando o touro caía de cansado, eram acendidas tochas em baixo dele para que ficasse de novo em pé.

– Outro artifício para “tornar o touro mais ágil” era espetá-lo com lanças.

– Vários cães também eram perdidos, atingidos pelos chifres do touro ou pisoteados. Cães feridos, muitas vezes com os órgãos à mostra, eram incentivados a continuar atacando, sendo invariavelmente pisoteados.

O surgimento do Bull Dog

Historicamente, o termo bulldog possui dois significados. O primeiro diz respeito à aparência de um determinado cão, desenvolvido na Inglaterra na segunda metade do século XIX. O cão hoje conhecido como bulldog inglês é, na realidade, uma distorção criada a partir de 1860, baseados no que um grupo de pessoas “achava” que era a conformação ideal de um bullbaiter. Nenhuma pintura que represente o bullbaiting mostra um animal com as deformações do moderno bulldog, mas sim cães bastante semelhantes ao pit bull.

O segundo significado, muito mais antigo, é um termo funcional: qualquer cão capaz de ser efetivamente utilizado como bullbaiter. Esta é a definição que nos interessa.

Dentro desta conotação, eram bulldogs:

– Na Inglaterra, o bulldog propriamente dito, que evoluiu para o moderno pit bull;

– Na Alemanha, o mastim bullenbeisser, que resultou no boxer;

– Nas Ilhas Canárias, o bardino majero, ancestral do presa canário.

Seja qual for a definição, é aceito que o Bull Dog derivou dos mastiffs. A primeira referência explícita ao Bull Dog que se tem notícia foi feita em 1631 por um sujeito chamado Prestwich Eaton. Em uma carta para um tal George Willingham, solicita claramente “um bom mastiff e dois bons Bull Dogs”. Tem-se hoje como certo que o Bull Dog foi aos poucos sendo selecionado dentre os mastiffs de menor porte e maior agilidade.

Outro possível ancestral do Bull Dog é o alaunt. Esta raça foi descrita no livro Master of Game, do II Duque de York, em torno de 1410. Foram descritas três variedades: alaunt gentle, alaunt veutreres e alaunt of the butcheries, sendo realçada a aptidão para bullbaiting dos dois últimos. O primeiro se assemelhava a um grande grayhound. Acredita-se que tenha origem na China e tenha chegado à Europa junto com migrações de povos como os hunos e os álanos, no início da era cristã. Esta tese é reforçada por um livro chinês chamado Book of Odes, de 600 A.C. As descrições de duas raças neste livro (shan e shejo), tanto física quanto funcionalmente, são iguais às dos alaunt do Duque de York 2000 anos depois.

É possível que os mastins tenham tais cães como ancestrais. O que parece é que, sob a classificação de alaunt, estavam todos os cães de trabalho de então: os grandes cães de caça, os mastins e os Bull Dogs.

O declínio do Bull Dog

No início das lutas de cães, o Bull Dog ainda era o cão mais utilizados pelos baiters. Não demorou muito para os organizadores das rinhas percebessem que, embora o pesado Bull Dog, com seus 35-45kg, fosse um excelente combatente contra touros, um cão mais leve e ágil seria mais apropriado para as lutas de cães.

Para atingir este objetivo, o bulldog foi cruzado com diversos tipos de “game terriers”, daí resultando o bull-and-terrier (não confundir com o bull terrier), posteriormente denominado staffordshire bull terrier. Em 1866, no livro Researches into the History of the British Dog, o autor George Jesse escreveu: “O bull-and-terrier, por sua maior agilidade, superou o bulldog nos combates no pit”.

Muito tempo se passou até que o bull-and-terrier se tornasse razoavelmente homogêneo e reconhecível como uma nova raça. No início, não se cruzava um bull-and-terrier com outro bull-and-terrier, mas sempre um bulldog com um terrier. Somente a partir de 1850 eles começaram a se homogeneizar.

Um dado interessante que explica a grande diversidade de características físicas desses cães é o segredo mantido pelos criadores do século XIX acerca de seus métodos de criação. Mesmo quando registrados em papel, o que era raro, os pedigrees não eram divulgados, por receio de que os rivais descobrissem o segredo do sucesso e pudessem replicá-lo.

Em todo caso, em meados do século XIX os bull-and-terrier já tinham adquirido todas as características apreciadas nos dias de hoje: capacidade atlética, gameness incomparável e temperamento afável.

O estabelecimento da raça na Inglaterra

Embora criado num passado recente e razoavelmente documentado, a origem do pit bull é um pouco nebulosa e está dividida, basicamente, em duas vertentes, ambas defendidas por autores de renome:

– O pit bull é exatamente o antigo bulldog

Esta tese é suportada por autores como Richard Stratton e Diane Jessup. Para eles, não existe nenhuma característica no pit bull que justifique sua origem em um terrier. Embora possa ter ocorrido alguma introdução de sangue terrier no século passado, isso não foi de forma alguma significativo. O cão que é uma evolução do bull-and-terrier (cruzamento do bulldog com game terriers) é o moderno bull terrier.

– O pit bull é o resultado do cruzamento do Bul Dog com os game terriers

Carl Semencic e a vasta maioria dos dog men, como Dan Gibson e Bert Sorrells, defendem a tese de que o pit bull é realmente o aprimoramento do bull-and-terrier, ou half-and-half. A base que oferecem são pinturas de época, mostrando que tais cães são virtualmente idênticos ao pit bull tal como o conhecemos.

Esta segunda tese me parece mais lógica. Embora não seja a especialidade do pit bull ficar se enfiando em tocas, um observador mais atento perceberá que há muita semelhança entre o comportamento de terriers como o jack russel e o patterdale e dos pequenos pit bulls das linhagens ditas “de combate”. A independência, a obstinação (muitas vezes considerada teimosia), a agressividade em relação a outros cães e a forma como pulam são atributos comuns a ambos.

Algumas fontes citam o extinto white terrier como o utilizado na obtenção do half-and-half, embora não hajam provas disso. O mais provável é que os ditos rateiros – terriers extremamente game utilizados em competições nas quais vencia o cão que matava o maior número de ratos num dado lapso de tempo – tenham sido os escolhidos.

O resultado da fixação do bull-and-terrier foi o cão que ainda hoje é conhecido como staffordshire bull terrier. Fotografias da segunda metade do século passado mostram claramente que era este o cão utilizado nas lutas de então na Inglaterra e que foi trazido para os Estados Unidos. Um exemplo documentado é uma fotografia de um famoso dog man inglês de então, Cockney Charles Lloyd, que trouxe vários cães da Inglaterra. Um desses cães, Pilot, aparece numa foto de 1881 e é claramente um staff bull. Pilot veio a ser um dos pilares da linhagem Colby, através do lendário Colby’s Pinscher.

As opiniões de Jessup e Stratton, porém, não devem ser desconsideradas. Observem a semelhança entre um Bull Dog de 170 anos atrás e um pit bull de linhagens mais pesadas, como o Pit Canchin.

A chegada na América

Como visto, os ancestrais imediatos do pit bull foram os pit fighting dogs importados da Irlanda e Inglaterra a partir de meados do século XIX.

Na América, a raça começou a divergir ligeiramente do que estava sendo produzido naqueles países de origem. Os cães não foram utilizados apenas para rinhas, mas também como catch dogs – presa de gado e porcos desgarrados – e como guardas da propriedade e da família. Daí começaram a ser selecionados cães de maior porte, mas esse ganho de peso não foi muito significativo até cerca de 20 anos atrás.

Os cães irlandeses, os famosos Old Family Dogs, raramente pesavam acima de 12kg e cães de 7kg não eram raros. O anteriormente citado LLoyd’s Pilot pesava 12kg. No início do século, eram raros os cães acima de 23kg. De 1900 a 1975, houve um aumento pequeno e gradual no peso do pit bull, sem que houvesse perda de performance no pit.

Nas mãos dos criadores americanos, o pit bull se popularizou a ponto de ser símbolo dos Estados Unidos na 1ª Guerra Mundial. Homens como Louis Colby, cuja família mantém até hoje uma tradição de 109 anos, C.Z. Bennet, fundador do United Kennel Club (UKC) e Guy McCord, fundador da American Dog Breeders Association (ADBA), foram fundamentais na consolidação da raça.

Sua popularidade atingiu o auge na década de 30, quando o seriado infantil Little Rascals era estrelado por Pete, um pit bull: era o cachorro favorito de 10 entre 10 crianças americanas. Esta projeção levou finalmente o American Kennel Club (AKC), após anos de pressão a reconhecer o pit bull com o nome de staffordshire terrier, para diferenciá-lo dos cães voltados para rinhas. Este cão é hoje o american staffordshire terrier, tendo o “american” sido acrescido ao nome original em 1972 para evitar confusão com o staffordshire bull terrier.

Mas agora, quando a vasta maioria dos APBT não é mais selecionada para a performance tradicional no pit (compreensível, já que o processo seletivo em si – o combate – é crime), o axioma americano “bigger is better” passou a valer para vários neófitos que se tornaram criadores, aproveitando a popularidade da raça nos anos 80.

Isto resultou num aumento vertiginoso no tamanho médio do pit bull, muitas vezes de forma desonesta, pelo cruzamento com raças como mastiff, mastim napolitano e dogue de bordeaux. Alguns autores, como Diane Jessup, sustentam que o american bulldog nada mais é do que a fixação de linhagens maiores de pit bull.

“outra modificação, esta menos visível, que vem sendo introduzida desde o século XIX são os estilos de luta geneticamente programados (tais como especialistas em orelhas, patas e focinho), função do nível de competitividade que as lutas atingiram.

A despeito de tais modificações, a raça tem mantido uma notável continuidade por cerca de 150 anos. Pinturas e fotos do século passado mostram cães idênticos aos dos dias de hoje. Embora pequenas diferenças possam existir entre algumas linhagens, no geral temos uma raça que, ao contrário de muitas outras ditas “reconhecidas”, está consolidada há mais de um século.

A ADBA é hoje a entidade de registro mais preocupada em manter o padrão original da raça. Hoje, o grande desafio da ADBA é preservar tanto quanto possível as características originais do pit bull, de modo que as futuras gerações possam ao menos conhecer um cão que manteve a estrutura dos antigos cães de combate. O padrão da ADBA foi estabelecido com base na descrição da estrutura ideal de um cão de combate feita por pessoas ativas nas lutas de cães nos anos 60 e 70. Ainda há uma forte preocupação com o temperamento, sendo as competições de tração, ou weight pulling,a forma de determinar se o cão possui a tenacidade, ou gameness, à altura de seus antepassados. A ADBA reconhece que as lutas de cães são hoje uma atividade moralmente inaceitável, mas cultiva um grande respeito por todos os dog men do passado – John P. Colby, George Armitage, Joe Corvino, Earl Tudor, Bob Wallace, Bob Hemphill, Howard Heinzl, Ralph Greenwood, Jake Wilder e tantos outros – que nos brindaram com este animal incomparável que hoje é o American Pit Bull Terrier.

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