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Substância contamina golfinhos na costa brasileira

8 de fevereiro de 2012
3 min. de leitura
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Substância que retarda chama em diversos produtos é encontrada em cetáceos que vivem no alto-mar

Uma substância usada para impedir que peguem fogo produtos tão variados quanto celulares, embalagens de alimento e travesseiros já está contaminando a costa brasileira, chegando a ser detectada em golfinhos de alto-mar. Animais estudados vivem em uma população isolada no Sul e no Sudeste.

Willian Rossiter/Cetacena Society International

Os chamados retardantes de chamas (ou PBDE – éter difenil polibrominado) foram achados em nove golfinhos-pintados-do-Atlântico (Stenella frontalis), capturados acidentalmente por pescadores entre 2004 e 2007 na costa de São Paulo, Paraná e Santa Catarina.

Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) e da Universidade Federal do Rio Grande (Furg-RS) fizeram a descoberta após analisar a gordura dos animais. Encontraram também altas taxas de pesticidas organoclorados como DDT – usado em plantações do Vale do Ribeira até 1997 – e PCB (bifenilpoliclorado ou ascaréis), também proibido desde 1981, proveniente, por exemplo, de indústrias de transformadores na baixada santista.

O trabalho, publicado na edição deste mês da revista Chemosfere, mostra que a concentração dessas substâncias não chega a ser maior que a observada em outros cetáceos de áreas mais poluídas, como a costa japonesa e a costa leste dos EUA.

Para os pesquisadores, porém, o estudo serve de alerta porque essa espécie de golfinho não vive muito perto da costa. Ela já foi observada, por exemplo, em pontos do oceano a 900 metros de profundidade.

Isso sugere que a contaminação pode estar se espalhando mar adentro, segundo o biólogo Marcos César de Oliveira Santos, do Instituto Oceanográfico da USP, que fez a pesquisa quando estava na Unesp de Rio Claro.

No caso do PCB, a contaminação observada nos golfinhos foi maior que a vista por outras pesquisas em toninhas (Pontoporia blainvillei) e botos-cinza (Sotalia guianensis), que vivem mais próximos da costa. “Ainda não conhecemos bem a movimentação da espécie. Pode ser que ela venha até a costa para se alimentar e tenha se contaminado, mas pode ser que os poluentes estejam espalhados.”

Além disso, como os golfinhos estão no topo da cadeia alimentar e as substâncias avaliadas são cumulativas, o fato de os animais estarem contaminados indica que todos os outros seres da cadeia também estão. Degradados no ambiente, esses poluentes são absorvidos pelo fitoplâncton, depois pelo zooplâncton que se alimenta dele, em seguida por crustáceos e peixes, até chegarem aos golfinhos – e, portanto, também aos seres humanos.

Os efeitos dos retardantes ainda não são bem conhecidos, até porque o uso do PBDE é recente – apareceu há cerca de dez anos.

“A gente, na verdade, não esperava encontrar nada ou somente traços da substância, justamente por ser recente”, comenta. Mas ao menos dois indivíduos, com menos de 1 ano, apresentaram taxas de PBDE acima do nível considerado fisiologicamente aceitável, ou seja, limite que passa a trazer consequências para o organismo. Para as gerações futuras, isso pode significar a ocorrência de má-formação, câncer e mortalidade.

Filhotes

Esse temor é reforçado por uma outra descoberta da equipe. Entre os animais analisados estava presente uma fêmea ainda em fase de amamentação. Os níveis de contaminação nela eram muito menores que nos demais.

Ao contrário dos machos adultos, que carregam os poluentes para sempre – e por isso são apelidados de “sentinelas de qualidade ambiental” –, as fêmeas, ao amamentar, acabam repassando-os para a cria. “Ela passa até 50% para o filhote”, diz Santos. “Esse animal pode não chegar à maturidade sexual. O que eventualmente pode afetar a reposição dessa população.”

Fonte: Estadão

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