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A insustentabilidade da produção de carne

6 de julho de 2011
9 min. de leitura
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O conhecimento é algo que liberta o homem, mas também junto com ele vem a responsabilidade de colocar este conhecimento em prática, e a consciência que cobra quando isso não acontece. Não poderia falar da insustentabilidade do consumo de carne sem falar da minha experiência no caminho ao vegetarianismo. Mesmo quando ainda não era vegetariana, e gostava muito de comer carne, vinha na minha mente o que aquele pedaço de carne que estava ali espetado no meu garfo havia passado até chegar ali. Estes pensamentos começaram a ficar freqüentes e freqüentes, e o dia de tomar a decisão de não mais comer carne estava prestes a chegar. Finalmente o dia chegou e eu parei de comer carne. Não foi fácil, mas hoje após alguns anos passados tenho uma percepção sobre a carne diferente da que eu costumava ter uma vida toda.

Comer carne em minha opinião é um luxo completamente desnecessário, é como: usar um casaco de pele, usar cosméticos super eficientes, trocar de carro ou celular a cada novo lançamento, como tantas outras coisas desnecessárias que existem em nossas vidas.

Quando vou me alimentar, com deliciosas comidas vegetarianas, o meu sentimento de alívio é tão maior do que qualquer outro que possa existir. E eu agradeço: “obrigada por eu poder viver, sem ninguém ter que morrer”. Isso me deixa muito satisfeita.

Faço essa introdução muito pessoal, pois o tema que vou tratar requer que todos tenham essa análise interna sobre o que é realmente importante na vida. Acho que este é o primeiro passo que podemos dar para a construção de um mundo mais feliz para todos.

Quando pesquiso sobre quando o homem começou a ingerir carne, o que eu descubro é que na sua essência o homem era vegetariano, ou melhor, vegano. O homem se alimentava de frutas, castanhas e tubérculos, portanto o homem não precisava de proteína animal para viver. O consumo de carne como fonte de nutrição teve início quando o homem começou desenvolver as pernas e podendo caminhar em terra firme com seus pulmões e mandíbula desenvolvida se tornou apto a caçar outros animais. O passo mais adiante foi domesticar e cercar o rebanho, com isso surgiu à propriedade privada, a acumulação de riquezas… Começa a revolução em torno do ter e consumir, que evoluindo para os dias atuais é o que nos impulsiona a consumir mais e mais…

Este artigo é mais um depoimento pessoal e informações colhidas no relatório da FAO (Organização das Nações Unidas para a agricultura e alimentação) intitulado e traduzido para o português como “A Sombra da Pecuária”, e vem demonstrar o custo ambiental da produção de carne.
Para aqueles, que como eu são apaixonados pela vida, o consumo de carne já feria de muitas formas, e somado ao que é preciso destruir, ambientalmente falando, para manter o sistema industrial de carne produzindo e em plena ascensão, acredito que está na hora de agirmos com responsabilidade e de acordo com o conhecimento que chega até nós.

O setor de criação de animais cresce como um dos três mais significativos contribuintes para os mais sérios problemas ambientais, em todas as escalas, da local para global. Os resultados da pesquisa da FAO mostram que deveriam existir mais políticas direcionadas para os problemas ligados a degradação da terra, mudanças climáticas, poluição do ar, escassez e poluição das águas e perda da biodiversidade, do que políticas de que impulsionem o desenvolvimento da pecuária, principalmente na América do Sul, onde os desmatamentos para pasto e produção de alimentos para animais estão a todo vapor.

Segundo o biólogo americano Edward Wilson, da Universidade Harvard, só será possível alimentar a população mundial no fim do século, estimada em 10 bilhões de pessoas, se todos forem vegetarianos. A produção de grãos de uma fazenda com 100 hectares pode alimentar 1.100 pessoas comendo soja, ou 2.500 com milho. Se a produção dessa área for usada para ração bovina ou pasto, a carne produzida alimentaria o equivalente a oito pessoas. A criação de frangos e porcos também afeta as florestas. Para alimentar esses animais, é necessário derrubar árvores para plantar soja e produzir ração. Mas, na relação custo-benefício entre espaço, recursos naturais e ganho calórico, o boi é o pior. Para cada 900 kg de alimento produzido, se produz apenas 1 kg de carne.

Apesar de não ser economicamente o principal ator global, o setor de produção de carne é socialmente e politicamente muito significante, emprega 1.3 bilhões de pessoas e cria a subsistência para um milhão de pessoas pobres no mundo. A criação de animais é responsável por um terço da proteína consumida pela população mundial.

O aumento da população e da renda, junto com uma mudança de hábitos alimentares, está rapidamente aumentando a demanda para a produção de carne, enquanto a globalização está estimulando o comércio de produção de carne em fornecimento e produtos. A produção de carne está projetada para mais que o dobro de 229 milhões de toneladas em 1999/2001 para 465 milhões de toneladas em 2050, e o leite de 580 para 1043 milhões de toneladas. O impacto ambiental por unidade da criação de animais para produção precisa ser cortado pela metade, apenas para evitar o aumento do nível de danos além do que já está prejudicado hoje.

O custo ambiental para nutrição desses animais que vão parar na mesa do consumidor carnívoro é muito alto.

Os três fatores unidos: ocupação territorial desmedida para a agricultura, criação de animais para o consumo e a alimentação desses animais são as maiores causadoras de desflorestamento no mundo, 70% das antigas áreas com florestas na Amazônia são ocupadas hoje com pastos.

Os efeitos desse desmatamento são:

– perda de habitats naturais
– extinção de espécies
– degradação ou erosão dos solos
– efeitos hídricos, aumento de inundações
– problemas na viabilidade de recursos hídricos com menos tamponamento florestal
– desmatamento em larga escala pode causar a morte de ainda mais florestas
– queda das chuvas em áreas de plantio no leste do Brasil (uma vez que as nuvens/chuvas são produzidas sobre a floresta tropical amazônica).

O setor de produção de carne é o maior agente transformador da terra. A área total ocupada por pastos é equivalente a 26% da superfície terrestre, não contando com as áreas ocupadas pelas geleiras. Em adição, a área total dedicada à safra para produção de alimentos para estes animais totaliza uma porção de 33% do total da área agricultável do planeta.

E estas áreas têm sido extremamente degradadas devido a não rotatividade de pastos, compactação e erosão criadas em conseqüência da atividade.

Com as temperaturas subindo, o nível do mar subindo, as geleiras derretendo, mudanças de correntes marítimas; as mudanças climáticas são o mais sério desafio enfrentado pelo planeta.

O setor de produção de carne é responsável por 18% das emissões de gás de efeito estufa. Isto significa mais emissões do que as produzidas pelo setor de transporte. Este alto nível de emissão de CO2 vem grande parte do uso da terra, especialmente do desflorestamento, causado pela expansão dos pastos e terras aráveis para a produção de alimentação para o rebanho. Além disso, o setor é responsável pela emissão de 37% do metano (23 vezes mais prejudicial do que o CO2), que ocorre devido à fermentação produzida pelos ruminantes. O setor também é responsável por 65% da produção de nitróxido de oxigênio, 64% das emissões de amônia derivada da atividade humana, o que contribui seriamente para as chuvas ácidas.

Além disso, mundo também esta caminhando para um futuro com sérios problemas de abastecimento de água, isto já é uma realidade em alguns países do mundo. É esperado que 64% da população mundial tenham algum problema com abastecimento de água potável em 2025.

O setor de produção de carne é um dos principais atores com relação ao aumento do uso da água, mais de 8% do uso global de água, grande parte para irrigação de áreas para a produção de alimentos para rebanho. E provavelmente o setor que mais contribui para a poluição das águas, contribuindo para eutrofização, morte de zonas costeiras, degradação de recifes de corais, problemas para saúde humana e muitos outros. Os grandes tipos de poluição vêm dos desperdícios dos animais, antibióticos e hormônios, químicos oriundos dos curtumes, fertilizantes e pesticidas usados na produção de alimentos para os animais e sedimentos oriundos de pastos erosivos. Nos EUA estima-se que os animais criados para consumo são responsáveis por 55% da erosão e sedimentação, 37% do uso de pesticida, 50% do uso de antibiótico e nitrogênio e fósforo jogados na água.

A produção de carne também afeta o reabastecimento de água potável: compactando o solo, reduzindo a infiltração, degradação de cursos de água, entre outros.

A perda de biodiversidade é outro fator de grande preocupação. Estima-se que esta perda está entre 50 a 500 vezes maior do que era no passado, segundo estimativa encontrada em fósseis. Dos 24 serviços ecossistêmicos 15 estão em declínio. A biomassa animal oriunda dos animais de produção representam 20% da biomassa animal no planeta, e 30% da terra habitada pela criação industrial fora antes habitat natural da vida selvagem.

Esta atividade é a líder em redução da biodiversidade, pois a mesma se concretiza por meio de desflorestamento, também é a atividade líder em degradação do solo, poluição, mudanças climáticas, sedimentação de áreas costeiras, entre outros prejuízos a ambientais.

Com todos esses dados, com esse conhecimento adquirido sobre o sistema industrial de produção de carne, é preciso rever antigos padrões, não há como continuarmos com este estilo de vida de consumo excessivo, o planeta não irá suportar essa carga. Por isso é necessário fazermos essa pergunta: o que de fato precisamos para viver, esse tipo de consumo desenfreando e sem consciência é necessário?

O mundo, infelizmente, não vai se tornar vegetariano de uma hora para outra, mas a consciência do que está acontecendo precisa existir, e a partir disso traçar uma caminhada mais amena, sustentável e menos cruel com os animais no mundo.

Existe uma iniciativa mundial para difundir a diminuição no consumo de carne chamada “Meat Free Monday”, tradução SEGUNDA SEM CARNE, que nasceu na Bélgica e já possuiu muitos adeptos em todo o mundo, o lançamento da campanha no Brasil foi em 2009, e a cada dia mais pessoas, empresas e municípios aderem a segunda sem carne.

Que movimentos como este sejam crescentes e que a cada dia mais pessoas peguem a sua parcela da responsabilidade pelos fatos insustentáveis (ambientais) e cruéis que existem no mundo, assim quem sabe, chegará o dia em que comer carne seja a exceção e não a regra.

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