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Defensores de animais e OAB pedem fim do uso de jegues e cavalos da Lavagem do Bonfim

7 de janeiro de 2011
6 min. de leitura
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Defensores de animais e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-BA) querem acabar com a participação de jegues, cavalos e outros animais na Lavagem do Bonfim na Bahia. As instituições ajuizam amanhã uma ação no Plantão Judiciário para tentar o que não conseguiram no ano passado: impedir o desfile dos animais na maior festa popular da Bahia depois do Carnaval.

O argumento é o mesmo de 2010. As ONGs Terra Verde Viva, Célula Mãe e Animal Viva, junto com a comissão de direitos dos animais da OAB, afirmam que, na festa, os bichos são submetidos a grande estresse, esforço físico desmedido, sons estridentes, açoites e temperatura escaldante.

A ação cautelar, baseada na Lei 9.605 (Crimes Ambientais), incide no processo aberto pela ação civil pública impetrada da outra vez e que tem como réus a prefeitura e a Empresa de Turismo S/A (Saltur).

Em 2010, a Justiça preferiu ficar em cima da cerca. O então juiz substituto da 8ª Vara da Fazenda Pública Mário Albiani Júnior acatou apenas parcialmente a ação. Pela liminar, concedida na véspera da Lavagem, a presença dos bichos foi liberada com a condição de a prefeitura fiscalizar e punir as situações de maus-tratos.

Imagens

Desta vez, porém, os ambientalistas acreditam ter um trunfo. O documentário Os Animais na Terra da Felicidade, produzido a partir de filmagens da festa do ano passado, foi anexado ao processo junto com fotografias. “Nessas imagens, provamos que não há qualquer fiscalização e os animais são mesmo submetidos a maus-tratos”, diz a coordenadora da Terra Verde Viva, Ana Rita Tavares.

“O documentário vai pesar. Uma prova robusta e inconteste”, concorda a representante da OAB, Alessandra Brandão. Na próxima quinta-feira, a Lavagem do Bonfim ocorre pela 266ª vez. As inscrições para o desfile terminam hoje. Caso a Justiça defira a liminar, a prefeitura terá que impedir o uso dos animais, mas ainda não se sabe sob qual pena. No ano passado, a multa era de R$ 50 mil.

Estresse em animal prenhe

Na briga entre tradição e meio ambiente, os ambientalistas têm ainda outra arma. Junto com a ação para proibir o uso cruel dos animais, vai a cópia de uma ocorrência registrada na 3ª DP (Bonfim), no ano passado.

O registro refere-se à prisão de um cavaleiro e a apreensão de dois adolescentes de 15 anos flagrados com um animal ferido na barriga, resultado de esporadas que o obrigaram a cavalgar por horas. Detidos pela PM, todos foram liberados após lavrados termos circunstanciados, para crimes de menor poder ofensivo.

Animais são feridos e continuam sendo explorados

Controle A Saltur, responsável pelo planejamento da festa, quer se responsabilizar apenas pelas entidades inscritas oficialmente. “É difícil controlar tudo. Os maus-tratos devem ser fiscalizados por órgãos de meio ambiente ou zoonoses”, apontou o presidente Cláudio Tinoco.

Enquanto isso, a intenção das ONGs e OAB é estender a ação a todas as festas populares da Bahia, inclusive o Carnaval. Ano passado, o bloco Mudança do Garcia chegou a assinar Termo de Ajuste de Conduta (TAC) com o MP para diminuir o número das tradicionais carroças no desfile. “Atrocidades não podem continuar sendo autorizadas em nome da tradição”.

‘Isso é moral de jegue’

Para os proprietários de carroças e tutores dos animais levados ao Bonfim, a tentativa de impedir o desfile dos animais não passa de, como se diz em baianês, uma moral de jegue. Antigos carroceiros, como o fotógrafo Valter Lessa, estão revoltados.

Animal submetido a trabalho escravo. Obrigado a carregar peso nas costas e puxar carroça pesada com arreios inadequados.

Lessa, que contabiliza 40 participações na Lavagem, 37 delas com carroça, chegou a ganhar dois troféus de carruagem mais bem enfeitada, na época em que a prefeitura concedia o prêmio, suspenso há dois anos exatamente por conta de uma solicitação do Ibama.

“É um insulto ao folclore da Bahia. Nossa cultura vai sendo mutilada”, critica ele, que diz nunca ter visto maus-tratos que lhe chamasse a atenção. “Pelo contrário. A gente trata os animais com o maior carinho. Dá água fresca do gelo derretido para os bichos beberem. O percurso é pequeno perto das distâncias que eles costumam percorrer no dia a dia”.

Moisés Cafezeiro, tutor do simpático jegue Pagode e fundador do bloco Levada do Jegue, mais uma vez toma a frente nos protestos contra a proibição. Cafezeiro prometeu articular uma reunião com carroceiros e cavaleiros de todo o estado para reverter uma possível liminar que tire os animais da festa.

Desreipeitado. Animal usado para puxar carroça com pessoas em cima em meio ao barulho e música alta do trio elétrico

“Vamos elaborar um documento para o Ministério Público, OAB e as ONGs, informando de que forma tratamos os animais. Se for pra pegar no pé, proíba as carroças de carregarem tijolo e vergalhões por aí. Mas acabar com nossa tradição é moral de jegue”, encerrou.

Maus-tratos em vídeo Em quase 22 minutos de duração, o documentário Os Animais na Terra da Felicidade, filmado na Festa do Bonfim do ano passado, mostra uma série de maus-tratos sofridos por jegues, mulas e cavalos. As imagens exibem animais feridos, sem ferradura, excesso de peso em carroças abarrotadas, além de instrumentos musicais e caixas de som estridentes colocados bem próximo aos animais.

Pelo que revelam as imagens, até mesmo uma mula prenhe é utilizada na festa. No vídeo, depoimentos de juristas, advogados, veterinários, criadores de animais e da própria população endossam o argumento dos ambientalistas, que hoje contatam o Ministério Público para que esse também participe da ação, como fez ano passado. “Juntos, vamos conseguir a proibição total dessa crueldade”, diz Ana Rita Tavares.

Vejo o vídeo abaixo:

Fonte: Correio 24 Horas

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