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Acompanhe os primeiros meses de vida do gavião-real

5 de junho de 2010
5 min. de leitura
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A árvore se destaca na mata com cerca de 30 metros de altura. Tanto que foi escolhida como a árvore da vida por um casal de harpias. No ninho formado por galhos e gravetos, dois ovos são chocados. A fêmea é maior: tem cerca de 90 centímetros de altura e pesa dez quilos. O macho não ultrapassa 60 centímetros.

A mais poderosa ave de rapina do mundo, também chamada de gavião-real, impressiona qualquer um. As asas de uma ponta a outra medem dois metros. As patas potentes exibem garras afiadas de até sete centímetros. É o mesmo tamanho das garras de um urso-preto.

Encontrar uma harpia em ambiente natural é sempre um acaso. Esse animal fica sempre em um galho alto, imóvel, à espreita de alimento. Achar um ninho de harpias é ainda mais difícil. Um deles foi encontrado em 2005. De lá para cá, o mesmo casal de harpias já fez o ninho três vezes na mesma árvore. Por isso, até uma escada foi montada na árvore em frente ao ninho. Lá no alto, uma plataforma para poder observar melhor esses predadores. O ponto fica a cerca de um metro abaixo do nível do ninho. É uma visão privilegiada de cada detalhe da reprodução desse animal.

Tudo começa no verão, quando o verde das árvores é mais intenso. É um dos mais longos períodos de reprodução no mundo das aves. A fêmea passa cerca de dois meses chocando os ovos e, depois, mais meio ano alimentando a cria. Assim que nasce um filhote, o outro ovo é descartado. Alguns dias após o nascimento, o “bebê-harpia” dá o ar da graça. A penugem totalmente branca já destaca o bico negro do futuro predador. Mas antes de se tornar um caçador, o filhote – além de crescer – tem muito a aprender.

Mesmo quando parece estar sozinho, o casal está por perto. A mãe é a que mais fica no ninho. Para o filhote, o ninho significa segurança, de onde ele não sai. Só se arrisca na borda na hora das necessidades básicas. A sujeira tem que ser jogada para longe. É preciso manter o ninho sem parasitas.

Nos primeiros meses, o jovem gavião-real é alimentado no bico.

O filhote parece brincar com as folhas verdes. De repente, a fêmea começa a pirar alto. O som forte ecoa na floresta. Seria para chamar o macho? Logo, ele aparece e, em pouco tempo, vai embora de novo. Horas depois, lá vem ele e trás mais comida. Em média, a cada dois dias, outro alimento é trazido.

De barriga cheia, a pequena harpia retribui o cuidado da mãe. Dois meses depois, o filhote dobra de tamanho. A plumagem branca dá lugar às primeiras penas e já tem pose de adulto. Ainda sem poder sair do ninho, o jeito é conhecer os bichos da floresta que passam por perto.

A rotina do ninho prossegue. Ora o calor é tanto que chega a dar sono, ora a chuva não dá trégua.

Mais um mês, e o filhote já mostra habilidade. O macho incentiva o jovem predador a comer sozinho, e ele aprende. O pai só ajuda nos pedaços mais difíceis de cortar. Por falar em habilidade, a pequena harpia já começa a exercitar as asas.

Em julho, época da seca na Amazônia, as folhas das árvores perderam um pouco do verde. E, se não fosse pelo tom das penas, o jovem filhote poderia ser confundido com os pais. Falta pouco para o primeiro voo. Ele já se arrisca, sai do ninho, sobe no galho, mas escorrega. Tenta de novo e consegue. Volta para o ninho com tranquilidade, pula e exercita as asas. Vai para os galhos mais altos e está pronto para caçar. Parece sentir o gosto da liberdade. Mas o ninho é sempre referência. E se engana quem acha que agora a alimentação é mais intensa.

Bradley Davis explica que os pais levam comida, a cada dois ou três dias, durante os primeiros meses. Quando o filhote já está crescido, ele pode ficar de três a quatro dias sem comer. “Ele fica bem desesperado esperando por comida, gritando”, conta o naturalista.

Com seis meses de vida, o filhote atinge a fase adulta. E depois de passar os últimos dois meses exercitando as asas praticamente todos os dias ele já sabe voar e está prestes a abandonar o ninho. Mas ainda vai depender dos pais para se alimentar por mais um ano até descobrir os segredos da selva e aprender a se alimentar sozinho.

Entre as lições a serem aprendidas está o grande desafio de manter-se vivo. Afinal, a harpia está na lista de animais ameaçados de extinção. O motivo é a diminuição das matas. O local onde as imagens foram gravadas é um bom exemplo.

Em uma das regiões mais desmatadas do Brasil, o casal de harpias fez o ninho em uma área com cerca de 100 hectares de floresta nativa, praticamente no centro da cidade de Alta Floresta, no Mato Grosso. As harpias só nidificam na região graças à diversidade de vida que insiste em permanecer naquele pequeno trecho de floresta.

“Pelo que todos os pesquisadores disseram, esse fragmento é muito rico em biodiversidade. Nós temos primatas, roedores, muitas aves. Então, a diversidade é grande. Elas encontraram comida para ficar nesse fragmento”, ressalta o ambientalista Vitória da Riva Carvalho.

O ninho é um exemplo: desde que exista uma mínima condição, a vida está disposta a resistir. A natureza sempre tem algo a nos ensinar.

Bradley Davis revela o que observou de mais curioso no comportamento de reprodução das harpias neste período: “Achei muito interessante o fato de que os adultos desmancharam o ninho totalmente, como uma forma de mandar o filhote embora. E funcionou bem”.

Assista às imagens:

Com informações do Globo Repórter

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