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Veganos não necessariamente vão para o céu

28 de fevereiro de 2010
3 min. de leitura
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O veganismo deveria ser considerado como a base de qualquer filosofia, religião ou estilo de vida, simplesmente porque é a prática do respeito por tudo que é vivo. É o viver na prática o significado do respeito à vida. Porém tornar-se vegano está muito longe de ser uma garantia de passagem para o céu ou sinônimo de integridade e caráter.

Conceitualmente, o veganismo é uma “filosofia de vida motivada por convicções éticas, com base nos direitos animais”, ou seja, é um estilo de vida adotado por indivíduos que, acima de tudo, respeitam os direitos animais. Pois a verdade é que há muitas outras portas de entrada para se tornar um vegano. E para cada porta, diferentes graus de consistência e de boas intenções.
 
Muitas pessoas que entram para o veganismo, ou seja, passam a não consumir nada de origem animal, não entram porque querem praticar o respeito pelos animais, mas porque querem fazer dessa máscara uma autoimagem positiva – para si mesmos ou para os outros. É o vegano que não tem consistência: porque não nasceu nele o respeito que fundamenta o veganismo. Nele existe outra coisa que não o respeito: a vaidade.
 
O equilíbrio se faz quando desenvolvemos todos os aspectos da vida: material, espiritual e intelectual. Não adianta nos voltarmos para os outros só para abandonar o nosso caos, a bagunça que temos dentro de nós. O veganismo não pode ser uma fuga: deve ser um passo inicial para mudanças maiores, para uma concepção mais lúcida da existência.
 
Veganos não precisam ser desorganizados, arrogantes, intolerantes, indelicados. Algumas pessoas parecem achar que, por serem veganas, possuem um “crédito de bondade”, uma espécie de pontuação de sobra, que lhes desobrigaria de agir corretamente em outros campos da vida.
 
Embora tenhamos, isto é verdade, um constante ar de indignação (sabemos o quanto sofrem os animais explorados pelo ser humano, sabemos das suas dores, sentimos um pouco do que eles passam), observo que muita gente confunde veganismo com “sou vegano, portanto sou superior”. E isso conduz à arrogância, à intolerância, à formação dos guetos que desunem ao invés de somar. Não, isso é um equívoco: o veganismo é, na verdade, o mínimo que se poderia esperar da nossa sociedade feita de homens e mulheres pensantes em evolução.
 
Se por um lado, fica feio criticarmos o governo por roubar, enquanto consumimos carne roubando a vida dos animais, fica também muito feio nos sentirmos no direito de julgar todo mundo só porque somos veganos, só porque fazemos o mínimo.
 
É claro que quem tem o conhecimento sobre o sofrimento dos animais e dos danos causados ao planeta, e mesmo assim continua consumindo derivados animais, possui uma responsabilidade maior do que aquele ser condicionado que não tem noção ou acesso à origem das coisas. Mas, ainda assim, isso não quer dizer que, no todo, nós veganos somos mais dignos ou evoluídos do que eles.
 
A coerência completa é quase impossível: somos todos imperfeitos e temos ainda um caminho de evolução a trilhar. Estamos cercados de pequenas possibilidades e de grandes condições desfavoráveis – nos distanciamos do que é natural, do contato com a terra e das coisas mais simples. Principalmente quando vivemos na cidade, onde o concreto cobre a terra e por onde dificilmente passam as bicicletas. Mas contamos ainda, e apesar de tudo, com nossa capacidade de discernimento, com nosso senso de ética, com nossa vontade de sermos melhores. Agora, mais do que nunca, tentamos o caminho de volta ao que é justo, ético e que mais se aproxima da verdade e da paz compartilhada.
 
Portanto, se considerarmos que estamos numa escola, e que essa escola é a vida, sendo veganos teríamos acertado apenas uma das dez perguntas da prova. Não “passamos de ano” direto e estamos bem longe de sermos superiores aos outros só porque aprendemos uma das respostas.

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