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Advogada escreve livro para educar crianças sobre os direitos dos animais

3 de fevereiro de 2010
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A advogada e professora universitária Renata Braga Klevenhusen acaba de lançar o livro Conhecendo os direitos dos animais, projeto voltado para o público infanto-juvenil. Ela pretende, com esse livro, alertar as crianças para as percepções de seus direitos e deveres com os animais.

Em entrevista ao Observatório Eco, Renata B. Klevenhusen explica que o desrespeito aos animais decorre “da falta de sensibilização e da não consideração do animal como semelhante”.

Professora de bioética e biodireito na Universidade Estácio de Sá, no Rio de Janeiro, ela entende que “deve haver repressão ao uso de animais como cobaias”. “Certamente, há meios alternativos, mas muitas vezes estes não são utilizados, pois apresentam um custo mais elevado”, completa Renata.

Segundo informações divulgadas pela WWF-Brasil, o Brasil é um dos países do mundo que mais exporta animais silvestres. Um negócio que movimenta mais de 1 bilhão de dólares e comercializa cerca de 12 milhões de animais por ano. Para vencer essa batalha, a advogada avalia que o grande desafio do país está na fiscalização e repressão eficientes. Por outro lado, ela afirma: “Para dar maior efetividade à legislação, campanhas de conscientização, como as expostas nos aeroportos brasileiros, são essenciais”.

Para a especialista, “tratar o animal não humano a partir de parâmetros humanos é um desrespeito.” Contudo, a advogada também verifica que muitas pessoas que possuem animais de estimação não se dão conta disso. Segundo ela, isso ocorre porque muitos acreditam que estão cuidando e respeitando o animal. “Essa é a forma como nós, seres humanos, aprendemos a demonstrar o nosso afeto pelos animais”.  Veja a entrevista que Renata Braga Klevenhusen concedeu ao Observatório Eco com exclusividade;

Observatório Eco: O que motivou a senhora a escrever um livro sobre o direito dos animais para as crianças?

Renata Braga Klevenhusen: Tenho uma filha de 8 anos e sou constantemente questionada por ela e por seus amigos sobre questões jurídicas. Além disso, o livro realiza um desejo, que só agora pude concretizar, o de auxiliar no processo de conscientização das crianças para torná-las adultos responsáveis e conhecedores dos valores sociais.

A criança é curiosa, reflexiva e dialógica por natureza. Utilizei o conceito de ‘direito’ no sentido de ‘respeito’ e ‘bom senso’, partindo de situações que fazem parte do cotidiano das crianças, estimulando a abordagem dos temas nos ambientes escolar e familiar.

O livro Conhecendo os direitos dos animais inaugura um novo segmento bibliográfico, voltado para o público infanto-juvenil, e pretende alertar as crianças para as percepções de seus direitos, deveres com os animais. Trata-se do primeiro volume da “Coleção Conhecendo os direitos”.

Observatório Eco: Quais as atitudes que mais a deixam chateada em relação ao desrespeito aos animais?

Renata Braga Klevenhusen: As atitudes que mais me afligem em relação ao desrespeito com os animais decorrem da ignorância, ou seja, da falta de informação e da falta de sensibilização. Com relação à falta de informação, posso apontar, como exemplo, a situação das fazendas-fábricas. Certamente, a grande maioria das pessoas não se dá conta de que o alimento que está sendo consumido decorre não só do sacrifício da vida animal, como também da ausência de uma vida digna para o animal.

Alguns até acreditam que os animais vivem em liberdade e que são abatidos após certo tempo e isso não é verdade. Os animais são criados em confinamento intensivo, com pouco espaço, com o objetivo de produzir o máximo com custo baixo. Além disso, são submetidos a modificações genéticas e a altas doses de hormônios e antibióticos.

Com o objetivo de “vender bem” o seu produto, as embalagens trazem fotos de animais vivendo em liberdade, “parecendo” felizes, ou seja, não despertando no consumidor qualquer postura crítica em relação ao processo de produção, gerando, portanto, a ausência total de sensibilização. Até a forma como designamos o produto animal auxilia esse processo, pois “nós não comemos o boi e, sim, um bife”. Essa designação retira do nosso processo avaliativo a figura do animal transformando-a, apenas, no produto animal.

Se o consumo de carne animal e outros derivados do animal ocorrem sem a devida sensibilização, todo tipo de sofrimento animal é visto como naturalidade.

Observatório Eco: Recentemente, publicamos no site uma matéria em que o Ministério Público firmava um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) com uma universidade no segmento de veterinária, que em vários procedimentos deixavam de dar um tratamento digno aos animais. Em sua opinião o que faz o homem ter essa distorção até hoje na relação com os animais?

Renata Braga Klevenhusen: Soube que a Universidade Federal de Viçosa (UFV) firmou um Termo de Ajustamento de Conduta assumindo o compromisso de não permitir que os animais sejam submetidos a experimentos científicos dolorosos ou cruéis, devendo ser providenciada a sedação e analgesia.

Em minha opinião, a ausência de atribuição de dignidade à vida animal decorre da falta de sensibilização e da não consideração do animal como semelhante.

Quando não consideramos o outro como semelhante, a tendência é permitirmos a sua instrumentalização. Konrad Lorenz, etólogo, faz uma comparação interessante que ilustra muito bem esta questão. Ele compara o homem paleolítico, armado com um machado de punho, com o piloto que transportou a bomba atômica lançada sobre Hiroshima. O manipulador do machado de mão via no outro o sofrimento que causava, ao duelar por alimento ou espaço e isso atuava como um mecanismo repressor da sua ação. Já o piloto que transportou as bombas e as lançou sobre Hiroshima e Nagasaki, apenas apertou um botão e viu como conseqüência da sua ação, um grande cogumelo. Ele é preservado do encontro com o outro e assim não vivência, do ponto sensitivo-emocional, a dor causada.

Assim, ao não considerar o animal como semelhante, a sua instrumentalização não causa qualquer desconforto emocional.

Observatório Eco: O Brasil agora tem uma legislação permitindo experiências em animais, como você avalia essa lei? Essa prática deveria deixar de existir?

Renata Braga Klevenhusen: Entendo que deve haver repressão ao uso de animais como cobaias. Certamente, há meios alternativos, mas, muitas vezes, esses não são utilizados, pois apresentam um custo mais elevado. Há, também, divergência a respeito da própria segurança dos resultados obtidos em modelos animais.


Observatório Eco: Quais os desafios do Brasil no cuidado com os animais silvestres? A legislação cuida de forma eficiente para proteger essas vidas?

Renata Braga Klevenhusen: No Brasil, temos duas leis, a 5.197/67 e a 9.605/98 e o Decreto 3.179/99, que constituem os principais instrumentos legais de combate ao tráfico de animais silvestres.

Segundo informações divulgadas pela WWF-Brasil, o Brasil é um dos países do mundo que mais exporta animais silvestres ilegalmente e é um negócio que movimenta mais de 1 bilhão de dólares e comercializa cerca de 12 milhões de animais por ano. O maior desafio está na fiscalização e na repressão. Contamos com equipes pequenas e com pouca estrutura. A maior parte do público consumidor está no Rio de Janeiro e em São Paulo.

Para dar maior efetividade à legislação, campanhas de conscientização, como as expostas nos aeroportos brasileiros, são essenciais.

Observatório Eco: Ultimamente, outra distorção do homem é tratar os animais de estimação com um exagero de cuidados “humanos”. Isso também não seria uma forma de desrespeitar os direitos destes animais? Porém, ao que tudo indica é um caminho sem volta essa relação humanizada com o “pet” de estimação?

Renata Braga Klevenhusen: Sem dúvida, tratar o animal não-humano a partir de parâmetros humanos é um desrespeito. Ocorre que aqueles que possuem animais de estimação não se dão conta disso, pois acreditam que estão “cuidando e respeitando” o animal e essa é a forma como nós, seres humanos, aprendemos a demonstrar o nosso afeto pelos animais.

Não acredito em caminhos sem volta. Contudo, temos um “mercado” que investe muito na formação dessa relação “humanizada” e trata-se de um “gigante” que continua em crescimento.

Observatório Eco: Situações como realização de rodeios, festas que promovem maus tratos aos animais ainda persistem? O argumento de patrimônio cultural deve estar acima do direito dos animais, nessas situações?

Renata Braga Klevenhusen: Trata-se de assunto que vem sensibilizando os tribunais brasileiros. O STF (Supremo Tribunal Federal) declarou a inconstitucionalidade de uma lei do Rio Grande do Sul que regulamentava as rinhas de galo e se posicionou contrariamente à realização da farra do boi. Atualmente, um RE (Recurso Extraordinário), também originário do Rio Grande do Sul, impugna lei estadual que autoriza o sacrifício de animais em rituais religiosos.

Entendo que só há a constituição de um “patrimônio cultural” desde que não haja incompatibilidade com a legislação e a Constituição brasileira veda a submissão dos animais à crueldade (art. 225, parágrafo 1º, inciso VII).

Observatório Eco: Quais os 3 direitos mais importantes para os animais?

Renata Braga Klevenhusen: Direito à vida digna, à liberdade e ao respeito.


Capa do livro infantil Conhecendo os direitos dos animais, de Renata Braga Klevenhusen



Com informações do Observatório Eco

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