EnglishEspañolPortuguês

Os bastidores das fazendas de extração de pele na China

21 de agosto de 2009
8 min. de leitura
A-
A+
Por Adriane R. de O. Grey  (da Redação- Austrália)

Quando investigadores de Swiss Animal Protection SAP/East International, em anos recentes, infiltraram-se em fazendas extratoras de pele na China, descobriram que muitos animais ainda estão vivos e debatendo-se ao terem suas peles arrancadas para comercialização no mundo da moda.

Os investigadores de Swiss Animal Protection SAP/East International estiveram em fazendas de extração de peles na província chinesa de Hebei e imediatamente perceberam porque estranhos são proibidos de visitá-las. A China é um país que não possui leis de proteção animal, o que significa que os animais podem ser criados e chacinados da maneira que bem convier aos “produtores” de pele. Os investigadores descobriram horrores que foram muito além de seus piores temores e concluíram: “As condições das fazendas de extração de pele na China são um deboche aos padrões mais elementares de bem-estar animal. Nas suas vidas miseráveis e em suas indescritíveis mortes, nega-se a estes seres o mais simples gesto de gentileza ou ‘humanidade’ ”. Nas fazendas chinesas os milhares de coelhos, coiotes, raposas, martas, guaxinins, cães e gatos vivem em gaiolas de arame instaladas ao relento, sujeitas às condições mais extremas, expostas às chuvas intensas, às noites geladas e ao sol escaldante. As progenitoras, levadas à insanidade pelo tratamento brutal, o confinamento insalubre e a falta de lugar calmo e protegido para darem à luz, frequentemente matam seus filhotes após parirem. Doenças e ferimentos são largamente espalhados entre os animais cativos e a psicose da auto-mutilação é comum entre eles, que também se atiram e se ferem repetidamente contra as grades das gaiolas.

Peles animais que estão sendo transportadas em Kashgar, cidade da China Foto: mongabay.com
Peles animais que estão sendo transportadas em Kashgar, cidade da China Foto: mongabay.com

Segundo o relatório de  Swiss Animal Protection SAP/ East International ( http://www.animal-protection.net/furtrade/report_fur_china.pdf ), 85% das peles negociadas no mundo vem de fazendas. A China é o maior país exportador de roupas de pele e, de acordo com fontes industriais, o maior produtor e processador deste mercado. 70 a 75% das peles obtidas no país são originárias de animais cativos, criados em fazendas que se estabeleceram, em sua maioria, nos últimos dez anos.

Raposas do ártico criadas em cativeiro para extração da pele Foto: divulgação
Raposas do ártico criadas em cativeiro para extração da pele Foto: Reprodução Associação Pelos Animais

Entre as espécies selvagens que são criadas para a extração de pele estão o cão-guaxinim, a raposa-do-ártico e a raposa-vermelha, a marta e o coelho conhecido como rex rabbit. Um número crescente de negociantes de peles, extratores e designers mudaram gradualmente seus empreendimentos para a China, onde a falta de leis restritivas à cruel extração de peles e a mão-de-obra barata tornaram sua lida menos difícil e seu lucro mais amplo. 

25 a 30% da produção chinesa de peles é obtida de animais selvagens. Capturados por armadilhas, estes animais podem ficar presos durante dias. De cada 4 animais, 1 escapa pela auto-mutilação do(s) membro(s) por que ficou preso, mas acaba morrendo por perda de sangue, febre, gangrena ou pela captura por um predador natural. Quando não escapam da armadilha, são mortos da mesma maneira cruel que o são os animais cativos, por estrangulamento, espancamento ou pisoteio, para que sua pele não seja “danificada” e possa cumprir os padrões de excelência deste mercado macabro.

Raposa pega por armadilha Foto: Reprodução Associação Pelos Animais
Raposa pega por armadilha Foto: Reprodução Associação Pelos Animais

Em 2006, as fazendas chinesas possuíam 4 milhões de raposas e estimados 4 milhões de cães-guaxinim, dos quais são as maiores “produtoras” mundiais. O número de martas, de que a China aparece como o segundo país produtor, aproximava-se de 10 milhões e crescia rapidamente. Em 2007 havia 10 universidades chinesas oferecendo cursos sobre como estabelecer e manejar fazendas de extração de pele.

O mercado internacional de peles é complexo: as peles são extraídas por fazendeiros e passam por vários países até chegar ao consumidor final. Mais de 95% da pele produzida na China é exportada e 80% deste “produto” que parte de Hong Kong é destinado à Europa, aos Estados Unidos e ao Japão. A China comercializa as peles não manufaturadas ou sob a forma de casacos, acessórios como mantas e chapéus, brinquedos, aviamentos como botões, fitas, fivelas e até mobília. Uma busca aleatória por boutiques na Suíça e em Londres revelou diversas peças de vestuário que usavam peles e apresentavam a etiqueta “Made in China” sendo exibidas entre as mais badaladas marcas de roupa.

Raposa esperando para ter a pele extraída  Foto: Reprodução Associação Pelos Animais
Raposa esperando para ter a pele extraída Foto: Reprodução Associação Pelos Animais

Na última terça-feira, o PETA (People for the Ethical Treatment of Animals) enviou um apelo pedindo apoio para pressionar contra a extração de peles na China. Entre março e novembro, especialmente, os animais são chacinados e vendidos. Sua pele é processada para atender as grandes feiras que ocorrem nesta época onde grandes empresas do mundo da moda vêm comprar seus estoques.

Rotina nas fazendas peleiras
Depois de uma curta vida de maus-tratos imensuráveis, milhares de coelhos, raposas, martas, coiotes, guaxinins, cães e gatos, entre outros animais, são literalmente arrancados de suas pequeníssimas e imundas gaiolas de arame pelas pernas ou pelas orelhas. Apavorados, agitando-se e tentando tanto quanto possível escapar da dor e morte certa, eles são arrastados pelos impiedosos “trabalhadores” das fazendas. São, então, jogados no chão ou contra as paredes e outras superfícies duras ou pisoteados no pescoço e cabeça para que sua pele não seja “estragada” ou “manchada” por um sangramento externo e para que, fazendo-os pararem de debater-se, os “trabalhadores” possam obter um corte preciso de suas peles. Algumas fazendas usam gás, envenenamento por estricnina, choque elétrico, estrangulamento ou degola como métodos de pseudo-homicídio: muitos destes métodos causam fraturas nos ossos ou convulsões, mas não morte imediata. Os investigadores chocaram-se ao constatar que os animais seguem estrebuchando e lutando por suas vidas até o final. Pendurados por uma perna ou jogados sobre suas costas para a retirada da pele, muitos ainda estão conscientes e movimentam-se, numa inútil tentativa de fuga. Com suas vítimas inconscientes ou não, os inescrupulosos “trabalhadores” cortam suas peles, que são, então, retiradas por sua cabeças. Os corpos despidos, sangrando, são jogados em uma pilha de outros corpos semelhantes. Carcaças? Não. Depois de 10 minutos deste ato de horror, muitos animais ainda apresentam pulsação e piscam os olhos. Um investigador atônito registrou um cão-guaxinim tendo forças suficientes para, de cima da pilha de corpos onde foi jogado depois da carnificina, levantar sua cabeça e olhar para a câmera, esmorecendo segundos depois. Os outros animais, de suas gaiolas, observam com terror e desespero todo o processo que lhes aguarda, enquanto os “trabalhadores” implacáveis seguem o massacre.
       
Quem aboliu o uso de peles, quem se recusa a abolir
O PETA Asia-Pacific comemorou recentemente uma grande conquista: a estilista australiana Allanah Hill concordou em abolir o uso de pele de coelho de suas coleções (http://blog.peta.org/archives/2009/08/victory_aussie.php ). Allanah decidiu fazê-lo depois de receber milhares de pedidos de ativistas e pessoas simpatizantes da campanha Fur-Free, que ficaram absolutamente revoltadas ao assistirem ao vídeo investigativo sobre as fazendas chinesas de extração de pele. A estilista reúne-se a designers famosos e agora compassivos como Calvin Klein, Polo Ralph Lauren, Kenneth Cole, Ann Taylor, Stella McCartney, Betsey Johnson, Marc Bouwer, Peter Morrissey e Tommy Hilfiger que, depois de discutir com o PETA por meses, também resolveu banir as peles de suas criações e anunciou sua decisão na publicação Women’s Wear Daily.

A atriz nova-iorquina Nia Long é uma dentre muitas das beldades que aderiu ao movimento em defesa dos animais. Nia posou nua num trem de metrô para uma campanha publicitária onde se lê “prefiro ir nua a usar peles”. A atriz declarou que desde que se tornou mãe começou a entender a importância que têm todas as formas de vida e de como devemos nos responsabilizar por elas. E, seguindo esta lógica, acrescentou que para ela não há diferença entre a exploração de animais para o uso de suas peles e a escravidão ou o Holocausto. Nia gravou uma entrevista que pode ser assistida no link http://blog.peta.org/archives/2009/08/nia_longs_naked.php.

Para Giorgio Armani, no entanto, nenhum destes fatos parece consistente ou relevante, pois, contrariando uma declaração que deu no ano passado para a revista Times de que não usaria mais peles em suas coleções depois de falar com integrantes do PETA dos Estados Unidos, o estilista apresentou entre as suas mais recentes criações jaquetas e saias arrematadas com pele, casacos e até casaquinhos de bebê com detalhes em pele. O PETA pediu ao costureiro que, então, assistisse ao vídeo investigativo feito nas fazendas chinesas de extração de pele, mas Armani recusou o pedido. Se você quer registrar seu protesto acesse o site da campanha pela abolição do uso de peles: http://www.furisdead.com/index.asp.

Você viu?

Ir para o topo