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Uma breve história dos gatos

26 de agosto de 2009
7 min. de leitura
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Há cerca de setenta milhões de anos, quando surgiram os primeiros animais mamíferos, surgiram os creodontes, que se desenvolveram após a extinção dos dinossauros  e deram início à história dos felinos . Os creodontes deram origem aos miacis, há cerca de quarenta ou cinquenta milhões de anos. Os miacis evoluíram, prosperaram e transformaram-se na moderna família de carnívoros que conhecemos na atualidade. O gato partilha com cães, ursos, doninhas etc. o mesmo ancestral comum. Os miacídeos tinham o cérebro maior que o dos creodontes e cerca de quarenta dentes.  Dentre as diversas ramificações dos miacis, podem-se encontrar os primeiros felinos: os proailurus, que caminhavam com a planta das patas no chão. Há vinte milhões de anos os proailurus deram lugar aos pseudaelurus, que já caminhavam nas pontas dos dedos e possuíam caninos poderosos e afiados. Deste grupo, emergiu o felidae, antepassado direto do atual gato doméstico. Durante os milhões de anos seguintes, o felidae subdividiu-se em muitas espécies, todas ligadas aos gatos modernos.

Grupos de felinos selvagens começaram a se espalhar pelo mundo, emigrando quando a caça se tornava escassa. Desta forma surgiram espécies variadas, cada uma adaptada a um habitat particular e às presas que existiam no local. Poucas dessas espécies sobreviveram (dentre as espécies extintas estão os tigres-dentes-de-sabre, ancestrais diretos dos felinos modernos, que desapareceram há 35 milhões de anos). A família dos felídeos, espalhada sobre quase toda a área de distribuição da ordem dos carnívoros, compreende três gêneros: Acinonyx (guepardo), Felis (puma, jaguatirica, gatos domésticos e todos os de pequeno ou médio porte) e Leo (leão, tigre, pantera, onça), com 37 espécies no conjunto.

A evolução da espécie fez surgir criaturas “construídas” para sobreviver. Os gatos de então já possuíam garras retráteis, que proporcionavam maior velocidade nas caçadas e contribuíam para um bote certeiro e mortífero. A dentição do gato também evoluiu com perfeição, com dentes preparados para segurar, furar, cortar e reduzir a presa a pequenos pedaços que poderiam ser facilmente engolidos.

Com o processo de domesticação, outras mudanças aconteceram, tanto físicas quanto comportamentais: o cérebro diminuiu, o sistema digestivo modificou-se para se adaptar a outro tipo de alimentação, a pelagem tornou-se mais variada, e o gato tornou-se mais dócil para adequar-se ao convívio com o homem.

Porém, o gato é um animal que ainda não está totalmente domesticado. A domesticação é um processo que requer várias gerações de acasalamentos seletivos, de modo a permitir mudanças fisiológicas, morfológicas e/ou comportamentais. Não se sabe qual a extensão de tempo que esse processo pode levar. O processo de domesticação do gato Felis catus foi único. Inclusive estuda-se a hipótese de os gatos terem passado por “autodomesticação”, isto, é, os humanos influenciaram pouco ou nada nas mudanças, exceto por permitirem que os gatos ficassem próximos a eles, a fim de aumentar a chance de sobrevivência e de melhor desempenho reprodutivo. É mais provável que tenha havido influência gradativa, que se tornou mais significativa. Exceto para o gato, o acasalamento durante o processo de domesticação de vários animais foi norteado pela seleção de características comportamentais que são mais quantitativas que qualitativas, resultando em maior docilidade e facilidade de treinamento.

Os gatos seguiram a urbanização de populações humanas, de modo que o acasalamento era mais uma questão de proximidade que de seleção humana.

O gato conseguiu aproximar-se do homem pelas suas qualidades de caçador – sem virar comida. Há sete mil anos foram encontrados restos mortais do Felis libyca, durante escavações em Jericó, atual Cisjordânia.

Mas foram os antigos egípcios os primeiros a usá-los no controle de animais daninhos que atacavam seus estoques de grãos. Os gatos da raça Abissínio são semelhantes ao gatos do Antigo Egito. Estátuas, desenhos e pinturas em tumbas revelam que os gatos nessa época eram de pelo curto, corpo esguio e pernas longas. Muitos consideram que este foi o ancestral da maioria das raças de gatos domésticos conhecidas atualmente.

No Egito o gato era reverenciado como um deus. Foi na forma de um gato que o grande deus sol Rá venceu Apep, a serpente da escuridão.

A deusa Bast ou Pasht ou Bastet era representada por uma gata ou pela cabeça de uma gata. Bast tornou-se tão importante, que os gatos passaram a ser venerados por todo o Egito. Os egípcios achavam que ter um gato em casa era garantia de muitos filhos na família, porque a deusa Bastet era também a deusa do amor e da fertilidade.

Comê-los ou matá-los era considerado um crime.

Quando um gato doméstico morria no Egito antigo, os tutores raspavam as próprias sobrancelhas em sinal de luto.

Os gatos no Egito eram mumificados e enterrados formalmente. Era ilegal contrabandear gatos para fora do Egito. Do Egito, os gatos foram levados para a Itália: na Roma Antiga, já eram considerados símbolos da liberdade, e qualquer representação da deusa da Liberdade apresentava um gato repousando a seus pés.

Da Itália espalharam-se pelo restante da Europa.

A ligação dos gatos com os cultos pagãos desencadeou uma campanha da Igreja Católica contra eles.

Nos mitos escandinavos, que originaram muitas das crenças pagãs, a carruagem de Freyja, deusa do amor e da cura, era puxada por gatos. A deusa guardava em seu jardim as maçãs com as quais se alimentavam os deuses no Valhalla, e houve a associação entre o gato e a própria divindade. O culto a Freyja foi considerado heresia, e os membros desta seita foran severamente punidos com tortura e morte. Como os gatos faziam parte do culto, foram acusados de serem demoníacos, principalmente os pretos.

No século X, o Príncipe de Gales, Howel, promulgou leis protegendo os gatos, estabelecendo valores de venda e garantias de compra. Além disso, a pena para quem matasse um gato era paga com trigo: o gato morto era segurado pela ponta da cauda e sobre ele era jogado o trigo, até encobrir a ponta da cauda.

No século XI ajudavam as pessoas a se livrarem dos ratos. Mesmo com o retorno dos gatos auxiliado pelas Cruzadas, a situação era mais de tolerância que de aceitação total.

Na Idade Medieval a Igreja Católica associou o gato a satanás e, portanto, às bruxas. Dessa forma, gatos, principalmente de pelagem preta, foram perseguidos e sacrificados largamente.

Na Europa o dia de Todos os Santos, data importantíssima para a Velha Religião (pagã), era comemorado, pelos cristãos, jogando na fogueira sacos cheios de gatos vivos. Os supersticiosos acreditavam que as bruxas podiam transformar-se em gatos, que eram, então, queimados vivos pelos cristãos que os consideravam agentes do mal. Se alguém fosse visto alimentado ou ajudando um gato, era denunciado como bruxa ou feiticeiro e era torturado e morto. As pessoas acusadas de bruxaria e seus gatos eram responsabilizadas por qualquer catástrofe que acontecesse: tempestades, estiagem, má colheita, doenças, mortes súbitas etc. A partir disso, o gato converteu-se em bode expiatório para as tentativas de “purificação” da Igreja Católica, ou seja, a eliminação de todo e qualquer vestígio do paganismo. Essa perseguição gerou várias superstições, como a de que cruzar com um gato preto “dá azar”, que o gato é o olho do diabo etc.

A prática de queimar gatos acabou por estender-se a qualquer tipo de comemoração, o que  quase dizimou  a população felina e, consequentemente, favoreceu a multiplicação de ratos, praga que portava um mal infinitamente superior aos “demoníacos” gatos: a peste bubônica ou peste negra. A peste disseminou-se por toda a Europa.

A peste bubônica, em meados do século XIV, devastou a população europeia. Historiadores calculam que aproximadamente um terço dos habitantes morreram dessa doença. A peste negra era transmitida através da picada de pulgas de ratos doentes. Esses ratos chegavam à Europa nos porões dos navios vindos do Oriente. E não havia mais gatos, predadores naturais dos ratos. Além disso, as cidades medievais não tinham condições higiênicas adequadas, e os ratos espalharam-se facilmente. Após o contato com a doença, a pessoa tinha poucos dias de vida. Febre, mal-estar e bulbos (bolhas) de sangue e pus se espalhavam pelo corpo do doente, principalmente nas axilas e virilhas. Como os conhecimentos médicos eram pouco desenvolvidos, a morte era certa.

No ano de 1400 os gatos estavam a ponto de desaparecer da Europa. Recobram-se a partir do século XVII, principalmente por sua habilidade em caçar ratos, causadores de perdas significativas nas lavouras e propagadores de doenças temíveis para o homem, sendo aceitos, novamente, nas casas e nos navios, para acabarem com os roedores.

A partir do século XIX, o gato voltou a ser exaltado – até por escritores como Victor Hugo e Baudelaire.

O Renascimento foi considerado uma época áurea para os gatos – quase todas as residências tinham um, dos castelos aos casebres na periferia das cidades.

A partir do século XVIII voltaram a ser populares e adorados como animais domésticos.

Atualmente, os gatos são considerados pets ideais, tanto para apartamentos como casas; não são ruidosos, não precisam ser levados para passear, comem pouco, são extremamente limpos, agradáveis e afáveis, sendo muito companheiros e fiéis a seus tutores.

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