EnglishEspañolPortuguês

A segunda vingança suína?

12 de agosto de 2009
5 min. de leitura
A-
A+
Ainda é cedo para a humanidade tirar conclusões a respeito dos possíveis estragos que a pandemia da gripe suína poderá causar ao mundo, porém o que mais tem de verídico e perceptível nesse momento é a incerteza das informações pertinentes ao tema. Em meio a tanto alarde, restrito ao mal físico que o vírus pode causar aos humanos e ao prejuízo econômico da indústria de carnes suína (inclusive rebatizaram o vírus de influenza A H1N1), pouco tem se falado das primeiras vítimas dessa cruel e fatídica história, que são os próprios suínos.

Desde que foram domesticados e trazidos à convivência humana há cerca de 9.000 anos, os porcos vivem, neste momento, a face mais triste e cruel de sua história. As modernas fazendas de produção industrial em larga escala, cujo processo de criação não leva em conta as características e necessidades naturais da espécie, são fatais para que ocorra toda a sorte de doenças, vírus e infecções. Os modernos criadouros suínos formam um ambiente completamente artificial e insalubre, sem ventilação e fétido, onde os pobres bichanos vivem enjaulados em pequenos recintos em que mal podem se mexer, pisando apenas num piso de cimento frio. Só veem a luz solar no momento em que são levados de caminhão ao matadouro. Nesse ambiente hostil, em que vários animais convivem em total confinamento, torna-se muito propícia a contaminação e proliferação de bactérias e outros microrganismos desencadeadores de patologias diversas.

E todo esse martírio começa com a dolorosa inseminação artificial das fêmeas, que logo em seguida permanecerão em minúsculas jaulas cercadas com barras de ferro onde sequer podem se virar. Ali aguardam sua gestação de quatro meses até serem conduzidas para a jaula de parir, onde, além de ficar em pé, conseguem apenas deitar para que suas tetas sejam alcançadas pelos filhotes. Estes, em menos de quatro semanas serão tirados da mãe, que após receber doses maciças de hormônios, entrará no cio e será inseminada, passando novamente por todo o ciclo de tortura. Devido a essas condições adversas, em que são violadas todas as relações afetivas e instintivas das mamães porcas, é que estas acabam ficando frustradas e entediadas. Completamente estressadas, mordem as barras de ferro que as cercam, além de ficar com o focinho em carne viva de tanto esfregar o chão de concreto à procura de terra e palha para construir o ninho que serviria para parir e proteger os filhotes. No mundo natural, as fêmeas chegam percorrer até 10 km  em busca de um lugar seguro para construir o seu ninho. Nas granjas de criação intensiva, devido ao peso e à falta de movimentação, começa a ocorrer pressão sobre os músculos e as articulações, ocasionando problemas graves de artrite.

Somam-se a isso, as feridas e a contaminação provocadas pela insalubridade de um local em que são obrigadas a deitar em cima das próprias fezes e urinas.

O calvário das porcas transformadas em máquinas de produzir carne se estende aos seus filhotes, que após duas semanas, serão retirados do calor e da segurança materna. Este e outros traumas os acompanharão pelos seus curtos 150 dias de vida. Já nos primeiros dias após o nascimento, os porquinhos têm seus dentes cortados sem qualquer procedimento que alivie a dor dos nervos expostos. Somente após 50 dias é que perderão aqueles dentinhos de leite. Mas antes disso, sem qualquer anestesia, terão também o corte do rabo, e os machos, os testículos arrancados. Nesses lugares não existe consideração e compaixão com a dor alheia, afinal o que importa é o lucro futuro com o bacon, a banha, o toucinho, a carne, a linguiça e tudo mais que possa ser feito com um porco esquartejado. 

Extremamente amedrontados, os porquinhos mutilados serão amontoados em pequenas jaulas imundas dentro de galpões com pouca ventilação, extremamente úmidos e sem nenhuma luz solar. Serão alimentados com ração, que além de hormônio, poderá ter em sua composição, farelo de peixe, o que já é uma aberração, pois na natureza os suínos não comem peixes. Como estão ali apenas para comer e engordar, é natural que os suínos defequem e urinem bastante, sendo obrigados a conviver em meio a esse ambiente insalubre e hostil a sua saúde. Cerca de 70% deles desenvolvem pneumonia e mais de um quarto sofrem com parasitas como a sarna. E dê-lhe antibióticos e antivirais! Devido a essas condições imundas, aliadas à manipulação genética, é que os porcos acabam por contrair doenças e ao mesmo tempo desenvolver resistência contra elas. É o que pode ter acontecido com o vírus da gripe suína, suspeito de conter genes de várias espécies, entre eles o da gripe humana e aviária.

Na localidade de La Glória, no México,onde ocorreu a primeira manifestação da epidemia, a responsabilidade recai na criação de porcos das granjas Carroll, subsidiária da norte-americana Smithfield Foods, instalada ali em 1994 depois de ter sido expulsa da Carolina do Norte e da Virgínia por danos ambientais. A empresa cria e abate quase um milhão de animais por ano e é acusada de contaminar os recursos hídricos da região com as fezes e urinas dos animais, depositados em tanques de oxidação a céu aberto e coberto de moscas.

No mundo natural e num ambiente saudável, não ocorre esse tipo de situação. Os porcos são animais extremamente higiênicos, sensíveis e sociais. Têm uma inteligência igual ou superior a algumas raças de cachorros; atendem pelo nome e podem reconhecer entre 20 e 30 indivíduos diferentes. Então, a natureza é sábia e não é à toa que surgem nesse meio epidemias como a suína. E quem é o principal responsável por essa situação senão o consumidor?  Quem sabe esta seja a segunda vingança contra seus algozes, já que a primeira decorre das inúmeras doenças desencadeadas pelo consumo de suínos sob a forma de gordura saturada.

Você viu?

Ir para o topo