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A crueldade dentro dos matadouros

10 de agosto de 2009
3 min. de leitura
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Animais mortos a machadadas ou marretadas, agonizando e lutando em vão contra a morte é apenas a principal evidência de uma série de irregularidades no Matadouro Público de Limoeiro do Norte, no Ceará. Na noite de sexta-feira (7), preparando para o abastecimento do açougue e frigoríficos da cidade, os animais são mortos e, com raras exceções, todos os processos, da depilação aos cortes, é realizado no chão encharcado de água, sangue e restos de fezes e vísceras. A pistola usada no abate está quebrada há mais de seis meses. O esgoto do local ainda deságua e contamina o Rio Jaguaribe.

Quem entra no matadouro público de Limoeiro do Norte, se não for de bota, provavelmente sairá com os pés encharcados de sangue e do que vier no chão sujo. O corte da carne, desde a retirada das vísceras, é realizado ali mesmo. Os animais chegam ao local e, contrariando a orientação (não menos cruel) para a carência de até 24 horas para o abate, em um mínimo de horas já estão sendo mortos.

Na noite de sexta-feira, 25 porcos foram abatidos. Aberta a porta do chiqueiro, um homem segura o bicho pelo rabo, outros dois esperam, com machado em punho, a aparição do animal pelo velho portão enferrujado. O primeiro homem solta o rabo, e o porco, pensando que vai fugir, é atingido com vários golpes. O animal cai, depois levanta, agonizando.

“Esse não levanta mais”, diz um dos abatedores. Em compensação, ainda passa alguns minutos agonizando, contorcendo-se até a morte. Na primeira leva dos nove porcos, é feito o corte e a retirada do pêlo. “Outra vez eu estava cortando o bicho, aí a faca pegou mesmo no meu tendão, que quase perco a mão”, conta seu Antônio Gomes. As vísceras do animal chegam às mãos de mulheres como a dona Auridênia Venâncio, há 15 anos trabalha na atividade. Ela trata os órgãos do animal no chão, sentada num banquinho, de vez em quando jogando um balde de água para afastar a sujeira.

“Aqui você não viu foi nada”, diz Ana Lúcia Martins, há 14 anos trabalhando no matadouro. Mostrou “duas reses” condenadas atrás do prédio. Foram mortas, mas estavam doentes. No dia seguinte, são levadas para o aterro sanitário, onde são queimados os bichos que “não prestam”.

Quem avalia os animais é o veterinário Endrego Girão. O profissional admite que “não são seguidas as normas de higiene”, do abate ao transporte da carne, feito com carros não refrigerados. Os gestores públicos dos municípios de Limoeiro do Norte, São João do Jaguaribe e Tabuleiro do Norte planejam a concretização de um consórcio público intermunicipal para construir e gerenciar um matadouro seguindo as normas da Vigilância Sanitária, mas, por enquanto, o projeto do abatedouro está apenas no papel.

Nota da Redação: “Normas de higiene”? Isso quer dizer que, ao exterminar uma vida, podemos praticar o crime de assassinato contanto que respeitemos as normas de higiene? “Gerenciamento de matadouro” era o grande absurdo que faltava para que se consolidasse a matança de animais para o consumo humano. Não devemos matar com higiene, não devemos matar com regulamentações: simplesmente não devemos matar! Nosso dever se limita a respeitar os animais. Não temos o direito de escolher tirar a vida de um outro ser. Assim como não têm os outros direitos sobre as nossas vidas.  A crueldade que existe dentro dos matadouros, onde são torturados e mortos os animais, é tão nociva quanto a indiferença de quem consome a carne desses animais. Que acabem os matadouros, e que as pessoas se conscientizem de que o abate é também um produto do consumo. Lamentável, deplorável, vergonhoso. “A Carne é fraca” é um bom documentário para entendermos a trajetória do alimento de origem animal até o nosso prato e a nossa responsabilidade como consumidores sobre a perpetuação dessa realidade cruel.

Fonte: Diário do Nordeste

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