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Livro: 'A Bondade dos Animais'

6 de maio de 2009
3 min. de leitura
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Por Ana Cardilho
em colaboração para a ANDA
Muitos de nós conseguimos nos lembrar de um momento em que estávamos transtornados ou de mau humor e o nosso gato ou nosso cão, por meio de um toque deliberado ou de um olhar, pareceu expressar grande preocupação pelo nosso estado. Em A Bondade nos Animais, a escritora e defensora dos animais Kristin von Kreisler combina estimulantes descobertas científicas com um compassivo entendimento do mundo natural para nos oferecer provas evidentes de que os animais são capazes de mostrar sentimentos extremamente fortes e que eles podem escolher expressar suas emoções por meio de um comportamento que é virtuoso e ético.
Finalmente. Ela melhorou. Confesso que eu já estava desanimada. Nos últimos meses minha dona enfrentou momentos difíceis. A depressão baixou as asas sobre ela. Aqui do meu canto, embaixo da cama onde gosto de ficar, eu só conseguia dar meus suspiros sentidos. Quando ela me colocava em cima da cama, ligava a tv ou o som, e ficava chorando, aquilo me partia o coração e eu tentava deixá-la bem. Passava a patinha no braço dela até que ela olhasse nos meus olhos, e muitas vezes dei boas lambidas nas lágrimas do rosto de minha dona. Eu latia, soltava ganidos fininhos, rosnava pra ela. Era minha maneira de dizer: “Vamos lá, levante a cabeça! Vai dar tudo certo, as coisas vão passar e ficaremos todos bem”. Ela se acalmava, me abraçava e dormíamos pertinho. Mas a tranquilidade durava pouco e logo eu acordava com minha dona andando pela casa, abrindo as janelas da sala, olhando a noite vazia.
Com a tristeza que ela enfrentava, a casa foi ficando sem luz porque ela já não fazia questão de abrir as cortinas e deixar o sol entrar. Nossos passeios eram curtos e sem graça. Eu sabia que ela se obrigava a sair da cama e me levar um pouco para a rua, mas podia sentir que isso exigia uma energia que ela não tinha naquele momento de depressão. Algmas vezes eu apelei. Lati bem brava para tentar chamar sua atenção ou fiquei de barriga para cima ronronando feito um gato. Essa tática dava resultados. Ela saía do marasmo em que se fechava e ia fazer carinho na minha barriguinha.
Acho que por um instante ela se sentia bem e voltava a acreditar na alegria. Até que os problemas foram sendo vencidos e eu percebi que ela andava mais animada. Primeiro apareceu com os cabelos cortados e pintados. Depois, umas roupas novas e trouxe flores para casa. Deixou o sol entrar e eu gostei! Nossos passeios ficaram mais animados e ela já não chorava antes de dormir. Ficava ao telefone. Uma mão segurando o aparelho, outra me fazendo carinho. Eu dormia com aquela conversa que tinha um tom amoroso. Quando a vi pintando os olhos e passando batom vermelho entendi: minha dona estava apaixonada! Foi muito bom vê-la varrendo porta afora a dona depressão. Fizemos festa, corri atrás da bolinha que ela ficou jogando pela casa e dei uns “olés” nela ao redor da mesa de jantar. Essa sim é minha dona! Animada, de bem com a vida, uma pessoa leve, alegre. Eu vou ficar bem esperta, farejando, de orelhas ligadas. Se sentir o cheiro da tristeza por perto de novo, invoco a memória dos meus antepassados, rosno, mostro os caninos e, se ela insistir, cravo-lhe os dentes! Sem dó! Posso parecer uma cachorrinha fofa e mansa, mas pra defender minha dona, viro loba… Ah, se viro!
Ana Cardilho é escritora e jornalista. Com um olho na realidade e outro na prosa imaginária conta com mais de 20 anos de experiência em rádio e TV, tendo feito reportagens, edição e fechamento de telejornais e programas, e é ficcionista.

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