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Bióloga americana afirma que os humanos têm sucesso à custa das outras espécies

6 de maio de 2009
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Lynn Margulis esteve recentemente em Lisboa, Portugal, no âmbito do programa de conferências internacionais organizado pela Fundação Gulbenkian com os grandes nomes mundiais da Biologia da Evolução, para assinalar os 200 anos do nascimento de Darwin.
Eloquente, carismática, divulgadora e comunicadora nata, a famosa bióloga americana da Universidade de Massachusetts em Amhers, que foi a primeira mulher do ainda mais famoso astrónomo Carl Sagan, continua, aos 71 anos, a dar conferências em todo o mundo e a publicar livros, uma parte em co-autoria com o seu filho, Dorion Sagan.
Os seres humanos continuam a evoluir ou estão perto do fim da evolução?
A evolução não para de maneira nenhuma, não para desde a origem da vida, porque é um sistema com várias componentes e a seleção natural é uma dos mais importantes. Ela representa a capacidade que uma determinada população tem para crescer face à capacidade do ambiente para a sustentar. A seleção natural é o fato que prova que este potencial de crescimento ainda não foi alcançado. Os seres humanos têm a capacidade potencial para gerar 22 filhos por casal, mas no Brasil foi encontrado um casal com 32 filhos. O fato de não atingirmos esse potencial deve-se à seleção natural, que dirigiu a evolução mas não a causou.
Se a evolução continuar, iremos ser mais homogéneos ou mais diversificados no futuro?
Não sei como vamos evoluir no futuro. Passei a minha vida a tentar reconstruir o passado, a história da Terra, através dos registos fósseis e de observações científicas de organismos vivos. Mas o futuro pertence aos anjos, não é possível falar dele.
E o que nos revela a Genética e a Biologia Molecular?
Neste momento temos uma série de ferramentas na Biologia e uma das coisas importantes que Darwin disse foi que toda a vida na Terra estava relacionada através do tempo com um antepassado comum. E a Biologia Molecular que se desenvolveu depois da sua morte mostrou claramente como ele estava certo.
Por que razão a espécie humana está hoje a ameaçar as outras espécies na Terra?
Porque a espécie humana tem uma disposição natural para ir além dos limites do seu ambiente regional, de se expandir para todo o lado, o que não vemos nos chimpanzés ou nos orangotangos. Os humanos vão e ficam fascinados pelos ambientes que consideram os melhores, que são basicamente os que encontramos na África do Sul ou na Califórnia. Clima ameno, água, vegetação, paisagem, plantas comestíveis, enfim, temos nestas regiões o tipo de ambiente que nos faz felizes, porque sabemos que vamos ter mais descendentes se vivermos nele.
E as outras espécies?
Ameaçamos as outras espécies porque elas têm os recursos que nós queremos. Se está em causa a sobrevivência dos nossos filhos ou da nossa família, nada mais importa. O sucesso dos humanos pode ser medido pelo crescimento da sua população e este tem sido feito à custa das outras espécies.
E adaptam-se sempre?
Não. Veja o que se passa hoje na Antártida, habitada por cientistas, onde estes criaram – como gostam – um ambiente africano dentro dos edifícios de habitação e de trabalho para poderem sobreviver, baseados nos combustíveis fósseis. Na verdade eles não se adaptaram no sentido evolucionista, eles não vivem verdadeiramente na Antártida, porque fora dos edifícios só encontramos animais.
Afinal, qual é a força motora da evolução?
Não uso a ideia de custo e benefício como alguns cientistas o fazem, porque essa é a linguagem dos bancos. Também não gosto de falar de competição e de cooperação, porque esses conceitos se aplicam aos clubes de futebol. A competição pode-se medir por pontos no desporto ou através do dinheiro na economia, mas na Biologia não é assim que a vida funciona. A linguagem da vida é a química genética e o metabolismo. E a sua força motora é a ideia de que as espécies vão ter descendentes para sobreviver num ambiente que tem sempre recursos limitados. E quanto mais sobreviverem mais descendentes terão. Portanto, o motor da evolução é mais um sistema e não uma simples força.
O criacionismo tem ganho um apoio crescente nos EUA porque a Teoria da Evolução falhou?
Não, de maneira nenhuma. A capacidade para nos decepcionarmos a nós próprios e para a irracionalidade é muito grande em toda a gente e os cientistas têm de combater essa tendência. Os EUA são um país muito anti-intelectual, especializámo-nos na ignorância. A Ciência insiste para observarmos o Mundo à nossa volta, mas os cristãos fundamentalistas americanos não observam nada.
Tem estado envolvida em iniciativas de diálogo entre a Biologia da Evolução e o Cristianismo. Acha que elas são importantes para neutralizar o movimento criacionista?
Absolutamente. De fato, tenho estado envolvida em iniciativas desse tipo com a Templeton Foundation, uma instituição que está a fazer um bom trabalho nos EUA. Quanto à Europa, estive recentemente no Vaticano, em Roma, na Universidade Pontifícia Gregoriana, e fiquei impressionada com o clima de abertura ao debate sobre estas questões. Os cientistas são pessoas como as outras e a maioria deles olha para as questões espirituais e para a atracção humana pela religião como uma tendência natural.
Qual é a concepção errada sobre a evolução mais comum entre o público em geral?
A mais comum nos EUA é que Deus criou o Homem há cerca de seis mil anos e pô-lo no Jardim do Éden. É inacreditável!
Uma boa parte dos seus livros é escrita com o seu filho, Dorion Sagan. Por quê?
Porque ele escreve muito melhor do que eu (risos). Dorion é um escritor de Ciência popular, planeia a forma e o conteúdo dos nossos livros e preocupa-se muito com a qualidade da escrita e da comunicação com o público. Quando tinha 18 anos olhou um dia para um dos meus textos e começou a fazer críticas e correções. Desde então trabalhamos em conjunto e estou muito satisfeita com o resultado.
Fonte: Expresso

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