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Mais de cem animais morrem nas obras do trecho sul do Rodoanel

7 de abril de 2009
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Mais de cem animais silvestres, que deveriam receber tratamento especial e ser removidos das áreas de mata atlântica onde estão sendo realizadas as obras de construção do trecho sul do Rodoanel, morreram. Parte era de espécies ameaçadas de extinção. Dos 137 animais enviados para recuperação em parques e clínicas veterinárias, 105 (76,6%) perderam a vida. São veados-catingueiros, macacos bugios, preguiças-de-três-dedos, lagartos teiús, gambás, cobras, corujas-orelhudas e várias outras espécies que deveriam passar por manejo cuidadoso, mas tiveram ferimentos graves ou estresse profundo – que resultaram em óbito. Outros 371 bichos foram devolvidos para a mata sem apresentar problemas, segundo dados da Desenvolvimento Rodoviário S.A. (Dersa), empresa do governo do Estado que administra a obra. Contudo, os mortos representam 21,9% dos que passaram pelas mãos dos técnicos da Dersa.
Os animais encontrados nas áreas desmatadas que precisam receber atendimento veterinário são levados pela Dersa para parques: o Pedroso, em Santo André; o Estoril, que tem um zoológico, em São Bernardo do Campo; e o Ecológico do Tietê, em São Paulo, além dos encaminhamentos para o Departamento de Parques e Áreas Verdes (Depave), da Secretaria Municipal do Verde e Meio Ambiente de São Paulo. Por causa da gravidade nos ferimentos de muitos desses animais, a própria Polícia Ambiental os encaminha para veterinários particulares ou para um santuário localizado na região oeste da Região Metropolitana de São Paulo, no sentido oposto das obras do trecho sul.
“Nesses casos você ultrapassa a esfera do dolo, da intenção. As mortes poderiam ter sido evitadas. A Lei de Crimes Ambientais só prevê punição quando há vontade livre e consciente de matar. Aqui pode ter havido imprudência, imperícia ou negligência. Se ficarem provadas, os responsáveis poderão responder pelos danos Já na esfera civil poderão ser punidos administrativamente, com multas”, explicou o jurista Jair Jaloreto Junior, especialista na área ambiental.
Para o professor Dênis Abessa, professor da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho do Câmpus do Litoral Paulista (CLP), manter animais silvestres em más condições também caracteriza um crime ambiental. Abessa realiza estudos do meio físico, da biodiversidade e das interferências da ação humana no Parque Estadual Xixová-Japuí, em São Vicente. Essa pesquisa servirá para revisar e complementar o plano de manejo de animais do parque. “A alta taxa de morte dos animais remanejados no Rodoanel indica algum problema na coleta, no transporte ou nos momentos seguintes dessas operações”, afirmou o professor.
Entre as vítimas que sobreviveram está uma preguiça-de-três-dedos que ganhou o nome de Toast quando chegou, em outubro de 2007, ao santuário Rancho dos Gnomos, que acolhe animais silvestres em Cotia. A preguiça teve parte do corpo queimado por fios de alta tensão e a pata esquerda acabou amputada porque as garras estavam mutiladas. “Ela ganhou esse nome porque ficou por muito tempo cheirando a queimado. Por sorte conseguimos tratar, e ela sobreviveu”, contou Marcos Pompeu, do santuário.
A mulher de Pompeu, Silvia, conta que durante as obras do trecho oeste do Rodoanel também recebeu vários animais que careciam de tratamento veterinário. “Hoje só acolhemos casos de emergência. A Polícia Ambiental sempre trouxe os animais para cá, talvez por confiar no nosso trabalho. E não recebemos nenhum dinheiro da Dersa pelo que fazemos”, disse.
O Rancho existe há 18 anos e abriga hoje quatro centenas de animais silvestres, incluindo 13 leões que estavam em circos, um tigre, uma jaguatirica, além de preguiças, macacos, aves, entre outros.
Outro animal vítima das obras do trecho sul é um macaco bugio, que teve quatro dedos de uma mão queimados numa fiação elétrica. “O Juninho chegou ainda bebê aqui. Operamos e ele vive bem agora”, comentou Silvia.
A mesma sorte não teve um veado-catingueiro levado por funcionários da Dersa em 1º de agosto do ano passado. Quatro dias depois, o bicho morreu. “Foi o estresse. Quando os veados são capturados é preciso ter muito cuidado”, observou Pompeu.
O laudo da necropsia da veterinária Kelli Spitaletti constatou ferimentos por todo o corpo, além de congestão e edemas nos lobos pulmonares. Outros três veados-catingueiros morreram na clínica veterinária de Felipe Giacobini, localizada na cidade de Embu, na Grande São Paulo.”Foi o pessoal da polícia ambiental que trouxe os animais, em momentos diferentes”, narrou o veterinário.
Todos precisaram passar por eutanásia, por causa dos ferimentos múltiplos e da impossibilidade de sobreviver. Um dos veados-catingueiros, espécie ameaçada de extinção, estava com a coluna vertebral fraturada. Outro teve a parte posterior do corpo mutilada por mordidas de cães. “Com certeza foram cachorros da vizinhança da obra. Os veados, à procura de alimentos, ficam perdidos entre a urbanização e o Rodoanel”.
O Estudo de Impacto Ambiental do Trecho Sul identificou a existência de 163 espécies de aves, 23 de mamíferos e 9 de répteis que habitavam as áreas das obras, principalmente nas cidades de São Bernardo do Campo e Diadema.
Fonte: Empresas & Negócios

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