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Ecos do feminismo na libertação animal

1 de outubro de 2010
6 min. de leitura
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Recentemente a bióloga e bacharel em comunicação social Tamara Bauab Levai, autora do livro Vítimas da Ciência – Limites éticos da experimentação animal, fez uma brilhante palestra no congresso vegetariano brasileiro sobre ecofeminismo.

Conheci gente que só foi ao congresso para assistir a esta palestra e lamento que eu não tenha podido assistir, pois este tema me fascina. De dentro de nossas bases, como biólogas, temos muito material para falar de como historicamente, biologicamente e economicamente a exploração da mulher e dos animais, da natureza como um todo, tem andado de braços dados. Mas a mulher é a única que tem voz e meios igualitários de se defender perante os demais de sua espécie, ou pelo menos deveria usar destes meios.

Ainda hoje, ser uma “mulher pública” gera o incômodo persistente de que há algo errado com ela. Não pode ser sério, não pode ser dela a fama. É por causa do marido, ela deve ter comprado o diploma, blá-blá-blá…

Será? Vemos isso na política, na sala de aula, em todo lugar. Isso é velho, mas ainda temos de ouvir. Enquanto discutimos sobre isso, ainda pesa no ar o preconceito contra as mulheres e a sutil comparação com a “natureza”, de forma depreciativa.

As mulheres possuem voz. Os animais, não.
Fritjof Capra, em seus livros excelentes, já relatou trechos de biólogos, psicólogos e outros sobre a sutil e inconsciente comparação da mulher com a natureza. Semelhante comparação feita por Tamara Bauab Levai nos seus artigos. E o físico Fritjof Capra, de forma sucinta, compara a exploração da mulher com a exploração da natureza. Segundo suas palavras, assim como o “homem” dominou e explorou a natureza, assim ele pensa em relação às mulheres e a qualquer expressão do feminino. As frases “dominar a natureza”, “explorar e invadir a natureza” seriam aplicadas ao comportamento com relação às mulheres em geral.

De modo que o feminino, sendo reprimido, não teve outra saída senão estar disfarçado por todos os lados, nas igrejas sob símbolos e nas roupas de sacerdotes entre outros modos de expressão sutil. Pois todos temos os lados masculino e feminino, e é natural que estas duas forças se expressem de qualquer modo, mesmo sendo negada.

Estas teorias/constatações, vindas de um físico, de biólogos e psicólogos, já são polêmicas. Mas parece que, quando uma mulher fala deste assunto, as pessoas se incomodam profundamente, como se à mulher coubesse apenas calar. Jamais discutir e denunciar o preconceito vigente. Por quê?

Outro psicólogo aqui do Brasil, Ezio Flávio Bazzo, denuncia em alguns de seus livros a nomenclatura pela qual as mulheres são ostensivamente chamadas e detalhes da natureza humana:

“Assim como em vários recantos deste planeta crianças são mutiladas e deformadas propositalmente por seus familiares e por outros adultos para serem usadas depois como instrumentos de mendicância, durante muito tempo os pés das mulheres chinesas também foram mutilados e diminuídos porque os homens sentiam excitação diante de mulheres com pés de criança. A pedofilia, talvez seja mais antiga que aqueles rochedos vulcânicos sobre os quais os arqueólogos e os paleontólogos tanto têm cacarejado.”

“Coelhinha. Cadela, vaca, cabrita. Esses ‘elogios’ frequentemente dirigidos às mulheres encontram sua expressão máxima no ambiente que os sulistas denominam matadouro.

Matadouro, lá no sul-maravilha é o lugar, como já relatou uma entrevistada, escritório, quitinete, apartamento, motel, garagem, etc., para onde os senhores-de-bem levam clandestinamente suas amantes ou suas meninas para f… [omitido neste artigo, mas não no texto original]… Seria ódio à mãe expresso de forma generalizada contra todas as mulheres?”

A mulher como objeto e os animais como objetos: exemplo de convite para festa. (Reproduzido de Myspace.com)

Segundo ele, essa mania de alguns homens de querer infantilizar a mulher, seja do ponto de vista físico, bem como do ponto de vista intelectual, e de preferir mulheres com comportamento infantiloide, seria uma atitude que denuncia uma preferência por modos infantis. Algumas mulheres entram no jogo, pois para que exista o opressor tem de haver os que voluntariamente se colocam como oprimidos. Já notei que alguns homens não suportam por muitos minutos uma mulher com uma opinião mais arrojada, ou simplesmente com opinião!

E Ezio Flávio Bazzo continua:

“Mãe é mãe… paca é paca… mulher é tudo vaca… a música do Bussunda não é apenas uma brincadeira, um humor negro e uma arte, é o cântico dos cânticos do mundo masculino. Para o homem comum, intelectual, rico, pobre, ignorante etc., a mulher não passa de uma vaca, começando pela mãe e as irmãs, continuando com a professora e terminando com a esposa, as filhas, as amantes. Numa pesquisa realizada numa faculdade da cidade, onde 99% dos alunos são mulheres, 30% do universo pesquisado acham que a mulher, se não é, pelo menos tem algo em comum com as vacas. Mãe é mãe… paca é paca… mulher é tudo vaca… Cantam pelos corredores da história. (…) Mas voltando ao assunto da vaca, desse animal passivo, de olhos tristes, que vive para ruminar e para enriquecer seus gigolôs (os pecuaristas) com leite, chifres, filé mignon e com a própria pele, por que será que as mulheres se indignaram bem mais com a música que as chama de vaca do que com as que as chamam de cachorras?”

Estas incômodas e irreverentes colocações são interessantes para mostrar como a sociedade aceita prontamente certos comportamentos. Como uma sociedade machista e presa a conceitos estreitos de liberdade pode pensar em libertação animal? Ainda estaremos longe de libertar os animais, se continuarmos a ajudar a construir nossas próprias grades. As mulheres ainda estão apoiadas sobre as grades que elas mesmas ajudam a manter. Algumas se orgulham de depreciar as demais. Como se a personalidade pessoal/o cabelo ou a maneira de ser interferisse na qualidade do trabalho, na profissão. Diferente dos animais, que não têm voz, nem escolha dentro do nosso mundo, aqui encontramos um paradoxo, que é o cultivar as próprias grades e se incomodar quando alguém se liberta.

Percebam como o mal prontamente se organiza, o bem é disperso, portanto também é mal.

Os que são contra os animais/mulheres/crianças  estão prontamente organizados e unidos. O restante é omisso e desunido. Triste realidade. Obviamente sei das exceções ao que escrevo aqui.

As palavras deste escritor, em todo seu significado, nos mostra de maneira clara como até mesmo a linguagem é presa aos diversos preconceitos existentes.

Gosto de frisar algumas palavras especistas, pois se fôssemos deixar de usar as palavras especistas, machistas, e de outras classes de preconceitos de nossa linguagem, rapidamente a língua portuguesa estaria fadada à extinção, até mesmo dentro de sua estrutura.

Num próximo artigo, citarei algumas frases misóginas de filósofos em que todos babam e que idolatram, os quais construíram as bases da filosofia moderna. E as relações entre especismo e machismo, além das que foram citadas aqui.

Referências

Bazzo, Ezio Flávio. Prostitutas, bruxas e donas de casa – notícias do Éden e do calvário feminino. Ed. LGE; 2009.
_________ . A lógica dos devassos – no circo da pedofilia e da crueldade. Publicação independente: Moloch publicadora; 2004.
_________ . Ecce Bestia – libertinagem com animais. Publicação independente: Narcisus publicadora & Cia; 2001.

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