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A cadela Diesel: vítima da civilização

4 de dezembro de 2015
Paula Brügger
2 min. de leitura
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Diesel, uma cadela da raça pastor malinois, tinha sete anos e era uma entre milhões de animais usados pelos humanos em operações de assalto e busca de artefatos tais como explosivos.
Ela morreu em dezoito de novembro de 2015, durante a chamada operação Saint-Denis, enquanto atuava numa missão para a qual foi adestrada: um trabalho de “reconhecimento de perigo”.
Sua morte foi decorrente de uma explosão provocada por uma mulher-bomba supostamente ligada à série de atentados terroristas ocorridos na noite de treze de novembro de 2015, em Paris.
A imprensa noticiou sua morte como a de uma heroína da guerra contra o terror e, por sua bravura, há até petições para que ela seja condecorada com a “Medalha Nacional de Defesa”.
Tal homenagem, entretanto, se conferida, não terá nenhum significado para Diesel ou qualquer outro cão explorado em operações covardes como essa. Terá significado apenas para os seres humanos que experimentarão uma sensação de dever cumprido por ter prestado a homenagem, o que provavelmente servirá para respaldar a continuidade dessa e de outras práticas congêneres.
O termo heroína não tem cabimento nesse contexto. Só seria pertinente se Diesel tivesse a exata noção do perigo a que era exposta, algo extremamente inverossímil. Vulnerável, tal qual uma criança pequena, foi ludibriada por quem mais tinha sua confiança e devoção. Foi traída por uma sociedade mergulhada numa racionalidade instrumental que transforma tudo em meios – inclusive as vidas de inocentes, humanos e não-humanos – na busca de soluções para problemas que não criaram e sobre os quais não têm e jamais terão ingerência alguma.
Os (animais) humanos precisam entender que os (outros) animais não nos devem nenhuma obrigação ou favor. Nesse sentido, Diesel pereceu não por causa do terrorismo. Sucumbiu nas mãos daquilo que chamamos de “civilização”.
Com toda a técnica que temos hoje é certamente possível substituir esses escravos não-humanos por robôs. Esse seria um dos mais nobres usos da técnica atualmente. Quais são os empecilhos? Custo? Somas astronômicas são gastas em empreendimentos e engenhocas técnicas sem importância alguma.
Porém, a dicotomia ética versus técnica é justamente um dos mais impenetráveis “véus de ideias” (como diria o filósofo alemão Herbert Marcuse) que marcam a nossa racionalidade instrumental.
A triste verdade é que as vidas desses e de bilhões de outros animais que são assassinados como instrumentos de pesquisa, ou para satisfazer o paladar humano, não têm valor algum.
O filósofo Karl Popper afirma que a civilização consiste essencialmente na redução (e na eliminação) da violência. É hora de começar a levar a sério essa ideia.

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